Redução do IR sobre o aluguel chega ao Senado: o que pode mudar no mercado de locação?

A alta carga tributária sobre a locação residencial tem sido um fator de desestímulo a investidores do mercado imobiliário. O aluguel é considerado um rendimento tributável pela Receita Federal, que deve ser somado aos demais ganhos do contribuinte para efeito de cálculo da alíquota incidente sobre o Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF). Quando o total de rendimentos tributáveis, incluindo o aluguel, é inferior a R$ 5 mil, por exemplo, os fatores redutores aplicados pela Receita implicam numa “mordida” relativamente baixa do Leão. Mas, para rendimentos mensais mais altos, superiores a R$ 10 mil - realidade de muitos investidores - , a fatia de imposto cresce progressivamente até se aproximar da alíquota máxima de 27,5% sobre os ganhos tributáveis. Diante deste cenário, investidores fazem contas e frequentemente migram seus investimentos para outros produtos do mercado financeiro com maior retorno - especialmente em períodos de juros altos, como o atual. Vale lembrar que os ganhos em renda fixa normalmente são tributados em 15%, e outros, como os rendimentos de fundos imobiliários, são isentos de Imposto de Renda, aumentando a competitividade desses produtos em relação ao aluguel tradicional. Sob esta perspectiva, o mercado imobiliário tem pleiteado uma revisão dessa política tributária da União. E, agora, essa demanda reaparece no Congresso Nacional sob a forma de um projeto de lei (PL 709/22), apresentado em março deste ano pelo senador Alexandre Silveira (PSD-MG). Bom para locadores, locatários e imobiliárias O projeto, que está em análise na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, propõe a alteração da legislação do IRPF para dar aos proprietários uma isenção de 75% sobre os valores recebidos na locação de imóvel residencial. Na outra ponta, o projeto determina que os valores gastos na locação residencial poderão ser deduzidos pelos locatários da base de cálculo do IRPF. Um terceiro item da proposta estipula que as multas relativas à falta de pagamento ou recolhimento de IRPF, à falta de declaração ou seu preenchimento inexato serão aplicadas em dobro quando envolverem renda decorrente da locação de imóvel residencial. A meta aqui é incentivar a regularização do processo. Todas as medidas valeriam por um período pré-determinado (entre 2023 e 2027), e não seriam aplicadas a imóveis comerciais.Combinadas, as medidas buscam alcançar dois objetivos, afirma o senador na justificativa do projeto de lei. Em primeiro lugar, “mitigar de alguma forma os efeitos que a pandemia do novo coronavírus teve sobre o setor imobiliário e sobre a renda de locadores e locatários, bem como os efeitos que virão de seu impacto mais duradouro sobre o cenário econômico brasileiro”; e, ao mesmo tempo, “atacar a extrema informalidade do mercado imobiliário brasileiro, criando incentivos significativos para que locadores e locatários declarem suas obrigações perante a Receita Federal”.Para o mercado imobiliário, a aprovação do projeto traria grandes benefícios, principalmente por desonerar a atividade de locação, tanto para proprietários quanto para inquilinos. A redução na tributação tenderia a aumentar a oferta de imóveis, o que reduziria por tabela o valor médio da locação. Num país com déficit habitacional ainda elevado, estimado em 6 milhões de residências, seria um passo adicional para dar acesso à moradia a uma maior parcela da população. “Estamos vivenciando um cenário de arrecadação e carga tributária recorde no país. O brasileiro está pagando mais imposto a cada ano, com menos recursos destinados a gastos essenciais, sendo necessário começar a corrigir o problema do custo do acesso à moradia com uma solução fiscalmente responsável e de médio e longo prazos”, afirmou ao Imobi Aluguel a head de Public Policy (Políticas Públicas) do QuintoAndar, Mariana Polidorio.Além disso, a redução da informalidade no aluguel prevista no dispositivo que aumenta a punição a quem não regularizar a atividade de locação, ajudaria a combater a desintermediação no mercado locatício. Não por acaso, a tramitação do projeto está sendo acompanhada de perto por grandes players e por entidades representativas do mercado imobiliário como o Secovi-SP e a CBCSI (Câmara Brasileira de Comércio e Serviços Imobiliários da CNC). Vai para votação? No último dia 9, o PL 709/22 teve parecer favorável do relator da matéria na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, senador Mecias de Jesus (Republicanos/RR).A inserção do projeto na pauta de votação do plenário do Senado, porém, ainda é uma incógnita. Além de estarmos nos aproximando das eleições de outubro - quando o calendário de votações tradicionalmente perde ritmo no Congresso -, trata-se em princípio de uma renúncia fiscal importante, o que é um grande empecilho em tempos de déficit público.Para Matheus Gutierrez, gerente jurídico da Crédito Real, uma das maiores imobiliárias de locação do País, a expectativa de aprovação do PL 709/22 é baixa diante da suposta perda de arrecadação por parte do governo. “Será uma surpresa se for aprovado o projeto, mas, em se tratando de política tudo pode acontecer, ainda mais no Brasil”, comenta, ao citar como exemplo a PEC dos Precatórios, que postergou parte dos pagamentos dos precatórios para o ano de 2027 e foi aprovada no final do ano passado, com anuência da Câmara e do Senado.Mas, por outro lado, o senador autor do projeto defende que o incentivo à formalização das relações locatícias pode compensar a redução nas alíquotas dos proprietários contribuintes, e sugere que a medida, inclusive, pode trazer mais recursos à União. Essa visão é compartilhada pelo Secovi-SP. Para o advogado Rodrigo Dias, integrante do Conselho Jurídico da entidade, a proposta embute a chamada “sanção positiva”, que são incentivos para que a norma seja cumprida. Desta forma, o locatário passa a considerar sair da informalidade com a isenção de 75% sobre o IR, diante de benefícios como fugir de multas, abrir lastro de renda ou mesmo ter mais acesso a serviços bancários. Já o inquilino passará a pressionar o locatário a formalizar o aluguel para poder deduzir esses gastos em sua declaração de IR. “É um modelo mais eficiente, mais inteligente, e que pode proporcionar uma arrecadação maior. Pega-se uma fatia menor, é verdade, mas de um bolo muito maior”, comenta Dias (clique aqui para ouvir a entrevista do membro do Conselho Jurídico do Secovi-SP ao podcast do Imobi Aluguel. O Imobi Aluguel também procurou o senador Alexandre Silveira, autor do projeto, para detalhar as razões que o levaram a apresentar a proposta, comentar os planos para compensar a renúncia tributária, de modo a não ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal, e fala das possibilidades de aprovação da matéria em pleno ano eleitoral. O senador respondeu por escrito a todas as perguntas enviadas pelo Imobi Aluguel. Confira abaixo a entrevista exclusiva. Entrevista com o senador Alexandre Silveira Imobi Aluguel: O senador conta com apoio formal de entidades representativas e empresas do mercado imobiliário para discutir o PL 709/22 e levá-lo com mais peso à pauta do Senado? Senador Alexandre Silveira: Desde que apresentei essa proposta, eu recebi apoio de muitas entidades e lideranças, reconhecendo a importância desse projeto e os benefícios que a sua aprovação poderá representar para todos os envolvidos: locadores, locatários e para o próprio governo. Eu tenho consciência de que a pauta do Senado está cheia, mas estou trabalhando para que essa proposta seja votada com a brevidade possível.Imobi Aluguel: Por qual razão o PL estipula que a isenção parcial de 75% sobre os valores recebidos na locação de imóvel residencial seria aplicada por um período restrito, de 5 anos (entre os exercícios de 2023 a 2027)? Alexandre Silveira: É uma forma de facilitarmos a tramitação e a aprovação da proposta. Isso já foi feito em algumas outras Leis. Coloca-se esse período para que todos percebam o benefício da Lei. Depois que se compreender como a proposta foi bem recebida, esse período pode ser estendido e um novo projeto pode ser aprovado de maneira muito mais fácil.Imobi Aluguel: Mesmo com o cenário de arrecadação e carga tributária recorde, o governo central ainda enfrenta déficit primário (R$ 35,1 bilhões), conforme apontado pelo Resultado do Tesouro Nacional consolidado de 2021. Como o senador pretende superar politicamente, junto aos parlamentares da base governista, essa contínua necessidade de arrecadação por parte do governo central? Alexandre Silveira: Eu tenho muita esperança de que o próprio governo perceba que essa proposta vai ser boa também para a receita pública. Todos sabem que nós temos uma taxa muito alta de sonegação de receitas com aluguéis. Na medida em que se dá um benefício para o locador e para o locatário, ambos vão querer formalizar esse negócio jurídico e o aumento de receita por parte do Governo vai ser natural.Imobi Aluguel: O senador tem uma estimativa, em números, do impacto que a aprovação da lei traria às receitas da União? Alexandre Silveira: Quando eu apresentei o projeto mostrei que os dados da Receita Federal revelam que o valor total pago a título de aluguel em 2018 foi de cerca de 5,3 bilhões de reais. Segundo o IBGE, por sua vez, no mesmo ano, os brasileiros gastaram com aluguel mais de 6,5 bilhões de reais. Trata-se, em tese, de uma diferença de mais de 1,2 bilhões de reais, ou mais de 22%, apenas entre declarações realizadas formalmente. O estímulo à declaração desses valores por locadores e locatários vai gerar a incidência do imposto de renda sobre eles e tem claro potencial de compensar eventuais renúncias decorrentes dos novos benefícios criados.Imobi Aluguel: O senador vê perspectiva política de que o projeto possa ser levado a votação ainda em 2022, ano eleitoral? Alexandre Silveira: Acho possível. Tão logo fique pronto o parecer do competente senador Mecias de Jesus, vou solicitar que o PL seja pautado na Comissão de Assuntos Econômicos e lutar pela sua aprovação. PODCAST IMOBI ALUGUEL 3 perguntas para Rodrigo Dias, integrante do Conselho Jurídico do Secovi-SP O advogado da entidade - que acompanha de perto a tramitação do PL 709/22 - comenta que a matéria é oportuna por fomentar a locação em período de crise, fala sobre a possibilidade de aumento de arrecadação e também sobre as probabilidades de a matéria ser votada pelo Congresso ainda em 2022. Clique e ouça! Ouça episódios anteriores no Podcast do Imobi Aluguel. Notícias da Locação Aluguel é questão de rendaO Censo QuintoAndar de Moradia, pesquisa realizada com 3.186 pessoas em parceria com o Instituto Datafolha, divulgada na semana passada, trouxe dados interessantes para o ecossistema da locação. Segundo o estudo, um em cada três brasileiros considera alta a chance de mudar de residência nos próximos dois anos. E, entre os que pretendem se mudar, 28% pensam em alugar uma moradia. A principal razão para optar pelo aluguel é a falta de recursos financeiros (70%). A garantia locatícia mais utilizada é o depósito caução (57%), à frente do fiador (15%) e de análise de crédito e de seguro (ambos com 7%). O valor médio do aluguel pago no país é R$ 686. O poder das placasUm dado do levantamento QuintoAndar/Datafolha que impressiona é o método mais utilizado pelos entrevistados ao buscar um novo lar: as placas de rua lideram, com 48% das respostas. Imobiliárias tradicionais e busca por sites e apps vêm em seguida, com 41% cada (eram permitidas respostas múltiplas). A pesquisa mostra um comportamento guiado pelas faixas de renda: nas classes AB, 55% utilizam sites ou apps para encontrar uma residência. Já na classe D, esse percentual cai para 28%. Limites para o aluguel comercial O prazo máximo para a renovação compulsória de aluguel comercial não pode ultrapassar cinco anos, mesmo que o contrato inicial tenha duração superior. A decisão foi da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que reafirmou jurisprudência anterior e o determinado pela Lei do Inquilinato. No caso em julgamento, a corte negou o recurso de uma rede de fast food, que pleiteava a renovação do aluguel de várias lojas em um shopping center de Porto Alegre (RS) nas mesmas condições do contrato original, que tinha duração de 13 anos. O STJ justificou que se o locador for obrigado a renovar esse tipo de contrato, criaria-se um desestímulo à assinatura de contratos de locação comercial mais longos. Robô “faz-tudo”Os chatbots vêm ganhando autonomia no mercado imobiliário. A Firefly, que desenvolve automações para imobiliárias, criou um serviço em que robôs desafogam a operação administrativa ao emitir segunda via boleto, agendar visitas, responder dúvidas sobre rescisão, entre outras funções. “São etapas que demandam tempo da equipe e geram espera do cliente, mas podem ser respondidas ou encaminhadas de forma rápida”, diz Rhuan Moraes, CEO da Firefly, que está desenvolvendo integrações para automatizar outros serviços, como análise fiança, financiamento, abertura de OS e solicitação de reparos. Indicadores Acesse a página especial organizada pelo Imobi Aluguel com os principais indicadores ligados ao mercado de locação: IGP-M, IPCA, Fipe/ZAP, IVAR, QuintoAndar e outros: Indicadores Imobi Aluguel.

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