Retrofit é aposta para futuro dos grandes centros urbanos
Resumo
O retrofit tem se destacado, nos últimos anos, como alternativa para requalificação de imóveis. Confira no Imobi 3 cases de empreendimentos.
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Apesar de não ser necessariamente uma novidade no mercado imobiliário, o retrofit tem se destacado, nos últimos anos, como alternativa para requalificação de imóveis localizados em áreas valorizadas de grandes cidades, mas que apresentam certo grau de degradação devido à ação do tempo, por serem antigos. Com a pandemia e a alta taxa de vacância de edifícios comerciais em regiões centrais, essa tendência deve ganhar ainda mais espaço, considerando a possibilidade de aumento de estoque de apartamentos compactos para aluguel, tanto para curta quanto para longa duração. Pelo menos, esta é a avaliação do CEO da OSPA, Lucas Obino, que considera o retrofit como parte do futuro dos grandes centros urbanos.
“Esse mercado já vinha em expansão mesmo antes da pandemia, assim como a lógica de redução dos escritórios, com o surgimento dos coworkings, e foi incrivelmente potencializado pela ascensão do home office durante a pandemia. Com a vacância dos edifícios comerciais, criou-se um mercado secundário de retrofit, com novas oportunidades de reaproveitamento desses imóveis como unidades residenciais, principalmente devido à queda da Selic, que deu mais sentido ao desenvolvimento imobiliário de locação para renda”, analisa. Pensando nisso, a OSPA está, inclusive, lançando um novo produto, no segundo semestre, para facilitar o escalonamento de empreendimentos de retrofit.
A ideia é reunir a expertise da OSPA em identificação de oportunidades de ativos imobiliários e desenvolvimento de projetos a uma nova linha de crédito oferecida pela Urbe.me. “Como nos projetos de retrofit já existe um ativo real, a gente consegue fazer operações com crédito relativamente mais baratos do que outras linhas de financiamento, como para um desenvolvimento imobiliário que tem, no máximo, o terreno como garantia. Com isso, vamos ter uma estrutura na qual fazemos a identificação das oportunidades de ativos, desenvolvemos um projeto que já une arquitetura e engenharia e oferecemos uma linha de crédito com o imóvel como garantia real, para obter melhores condições de financiamento de obra, para operadores que estejam interessados nesse tipo de negócio”, explica Lucas, que também é sócio-fundador da Urbe.me.
Para ele, a principal vantagem de projetos de retrofit, além da ocupação de espaços ociosos, é a aceleração do ciclo de obras, um dos principais gargalos do mercado imobiliário atualmente, sobretudo considerando o cenário pandêmico, no qual os desejos dos consumidores estão mudando mais rapidamente. “Dentro do desenvolvimento imobiliário, quando a gente pensa em renda, o tempo é um fator preponderante, até mais do que em uma incorporação propriamente dita. Com o retrofit, conseguimos fazer com que as unidades estejam prontas para moradia em pelo menos metade do prazo de desenvolvimento imobiliário tradicional. Claro que o tempo de aprovação do projeto pode variar, de acordo com o grau de conservação do imóvel e nível de intervenção necessária, além de atender a legislação local, que pode variar de cidade para cidade, mas, ainda assim, estamos trabalhando com um ciclo bem mais curto, de cerca de 24 meses”, afirma.
Conceito de retrofit e sua aplicação no mercado imobiliário
Quando se fala em retrofit, Lucas diz que a grande inspiração para esse tipo de projeto vem de experiências dos mercados norte-americano e europeu, onde isso já é feito há muito mais tempo. “O retrofit é muito comum em diversas regiões norte-americanas e europeias porque são cidades onde os centros urbanos já estão amplamente consolidados e há grande escassez de terrenos. Nesses locais, entretanto, muitas vezes é mais fácil derrubar edifícios inteiros e construir de novo, porque a mão de obra é cara, mas os insumos são baratos. Aqui no Brasil, o retrofit faz ainda mais sentido porque estamos vivendo uma realidade de alta dos materiais de construção”, avalia.
Mas, afinal, o que caracteriza um projeto de retrofit? De acordo com a arquiteta urbanista Leticia Domingos Vellozo, mestre em Planejamento e Gestão do Espaço e professora do curso de Tecnologia em Negócios Imobiliários da UFPR, o termo pode ser aplicado em diferentes contextos e significa “adicionar um componente novo que não estava presente quando alguma coisa foi produzida”. “Assim, o conceito é aplicável no contexto automobilístico, naval e também imobiliário. Nesse último, retrofit vai significar a intervenção em um edifício de forma a adicionar novas tecnologias e aprimoramentos em relação a sua eficiência. A instalação de novos sistemas de aquecimento ou de vedação térmica são exemplos de retrofit no contexto da arquitetura”, afirma.
Diferença entre retrofit, reforma e restauração
A professora também explica as diferenças de retrofit para uma reforma ou restauração. “No caso de edifícios de valor histórico ou cultural, um retrofit se diferencia de um restauro, pois este tem como objetivo trazer o edifício ao seu estado original, enquanto aquele envolve uma modernização das instalações. Diferentemente também do conceito de reforma mais tradicional, as obras realizadas visam uma atualização tecnológica, para uma maior eficiência dos sistemas de energia, hidráulico, entre outros, mas preserva as características arquitetônicas originais”, ressalta.
Por fim, Leticia analisa que o retrofit no mercado imobiliário vem ganhando destaque principalmente com o aumento das discussões sobre transição energética, emergência climática e crise hídrica. “De maneira não menos importante, o retrofit também aparece na discussão sobre a necessidade de repensar a ocupação das nossas cidades, já que também é uma forma de reverter a deterioração e esvaziamento de centros urbanos, possibilitando a ocupação dessas áreas que já são providas de boa infraestrutura”, revela.
“Os centros das cidades apresentam, de maneira geral, duas características marcantes: infraestrutura urbana consolidada e imóveis antigos. O retrofit é, nesse caso, uma alternativa para viabilizar a readequação desses imóveis, permitindo sua ocupação sem demolições e gerando um mínimo de perdas para a memória do local. A densificação dessas áreas com acesso à infraestrutura urbana (como rede de esgoto, transporte etc), aliada a políticas habitacionais adequadas, tem o potencial de reduzir o espraiamento desnecessário dos municípios, permite acesso mais fácil às oportunidades da cidades com trajetos mais curtos e, ainda, a desonera cofres públicos do gasto com expansão de redes”, completa Leticia.
Aplicação do retrofit no Brasil
No Brasil, as cidades com maiores oportunidades para retrofit são as mais antigas, com centros urbanos consolidados e regiões históricas que já são densamente ocupadas, com alto grau de degradação, como Porto Alegre, São Paulo e Rio de Janeiro. Ao poucos, no entanto, estão surgindo iniciativas em outras praças, principalmente na região Nordeste, onde os centros históricos apresentam grande potencial para esse tipo de projeto.
“A oportunidade é matemática. O retrofit faz sentido quando ele é mais barato do que construir do zero e isso geralmente acontece em cidades onde perímetro urbano consolidado e escassez de terrenos. Quando você tem esse contexto, os terrenos se tornam mais caros e o retrofit começa a fazer mais sentido, ainda mais para a lógica de locação, porque o aluguel está mais ligado à localização do que os imóveis para venda, já que o potencial inquilino está procurando mais eficiência e, estando no centro, gasta menos com transporte, por exemplo”, acredita Lucas.
Essa lógica também funciona muito bem para o turismo, com a locação de curta temporada. “Quando você está viajando, fica hospedado em locais que, muitas vezes, você não moraria porque estar ali faz parte da experiência de conhecer aquela cidade. Em imóvel retrofitado, você tem o espírito de um tempo, atualizado à demanda contemporânea, unindo o melhor desses dois mundos”, destaca Lucas. Para ele, essa pode ser, inclusive, uma grande oportunidade em cidades do Nordeste, para maior exploração do turismo local, ainda mais considerando o contexto de pandemia, no qual os turistas estão evitando hotéis e outras modalidades de hospedagem coletivas, dando preferência a aluguéis de curta e média duração.
Três exemplos de empreendimentos de retrofit no Brasil
No Nordeste, um dos primeiros projetos de retrofit é o do Bauten Cabo Branco, desenvolvido pela Bauten Incorporações, em João Pessoa (PB). Conheça este empreendimento e outros dois projetos de retrofit que já foram executados no Brasil:
1. Bauten Cabo Branco – João Pessoa (PB)
Localizado na Avenida José Ramalho Leite, no Cabo Branco, um dos bairros mais valorizados de João Pessoa (PB), o edifício Bauten Cabo Branco ocupará o lugar do antigo Porto Bello Apart Hotel, construído na década de 1980. Lançado em abril de 2020, o empreendimento surgiu como oportunidade para compradores que desejassem morar na região, mas também – e principalmente – para investidores interessados em um imóvel para segunda moradia ou para obter ganhos com aluguel de temporada. Ao todo, são 45 apartamentos residenciais de 19 a 39 metros quadrados e todas as unidades já estão vendidas, desde o final do ano passado, com previsão de entrega para agosto de 2021.
Para Daniel Magalhães, investidor da Bauten Participações, o principal desafio de lançar esse empreendimento foi a dúvida a respeito de como seria a aceitação do mercado local em relação a esse tipo de projeto. “Como o Cabo Branco é a região de praia mais cobiçada da cidade, falta área para incorporar porque a maioria já está ocupada – e aquelas que estão disponíveis são muito caras, como acontece em regiões centrais de outras grandes cidades, como São Paulo”, lembra.
Já as vantagens de utilizar o retrofit nesse empreendimento são muitas. “Primeiramente, a estrutura já está pronta. Com isso, temos um aproveitamento do ponto de vista ambiental, com menos geração de resíduos, além de um aproveitamento de tempo e também financeiro, entregando o edifício em menos de dois anos desde o lançamento e cobrando um metro quadrado mais acessível do que os nossos concorrentes do entorno, que estão subindo um edifício do zero”, destaca. Tudo isso, sem abrir mão de conforto e modernidade, garante Daniel. “Para esse projeto, fizemos inspeção e intervenção em todas as colunas e vigas. Hoje, temos um empreendimento que faz uma transição entre a história e a contemporaneidade, mantendo características que remetem às raízes do edifício, mas trazendo também novos elementos, como isolamento térmico e acústico”.
Confira abaixo algumas imagens do empreendimento.
2. All You Need – Curitiba (PR)
Construído entre 1927 e 1930 pelo arquiteto Frederico Kirchgässner, considerado um dos primeiros modernistas do Brasil, o edifício Guilherme Weiss, no Centro de Curitiba, surgiu com o propósito de abrigar o Hotel Martins, mas foi consumido por um incêndio em 1991. Quase 90 anos depois de sua inauguração, em 2019, o imóvel ganhou nova vocação, após integrar um projeto de retrofit idealizado pela GT Building, passando a fazer parte do empreendimento All You Need, que conta com 324 unidades residenciais, com metragens que vão de 17 a 44 metros quadrados. Executados com tratamento acústico especial, os apartamentos supercompactos contam com diversas inovações, como mobiliário inteligente e fechaduras eletrônicas com gerenciamento remoto.
Por conta do incêndio que atingiu o edifício em 1991, entretanto, apenas parte da fachada permaneceu intacta, junto com as vigas e as bases altas das paredes internas, o que fez com que a restauração demandasse muito esforço. “Um dos pontos mais desafiadores foi o restauro da estrutura de concreto, pois foi preciso um estudo aprofundado sobre a viabilidade de aproveitamento do aço e concreto original. Outro grande desafio foi incorporar as rampas e o elevador de acessibilidade ao edifício”, conta Alysson Sanches, diretor da GT Building.
De acordo com Alysson, a restauração do edifício Guilherme Weiss, agora chamado Regina Weiss de Castilho, foi pensada especialmente para contribuir com a revitalização da região do Paço Municipal e do Centro Histórico de Curitiba. “A proposta tinha como base o resgate da possibilidade de uso de espaços antes considerados improváveis para a habitação, fomentando assim um novo ciclo de desenvolvimento do Centro da cidade”, afirma. Ele acredita que o retrofit tem ganhado força nos últimos anos justamente por proporcionar oportunidades de requalificação de áreas como essas. “O reaproveitamento de construções contribui com a preservação e a manutenção da história arquitetônica e social da cidade. Além desse resgate histórico, o uso da técnica retrofit garante o reaproveitamento de espaços com mais segurança, transformando o que antes era considerado ultrapassado em equipamentos modernos, tecnológicos e inteligentes”.
3. Rio By YOO – Rio de Janeiro (RJ)
Também lançado em 2019, o residencial Rio By YOO, da RJZ Cyrela, ocupa uma localização privilegiada no Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro (RJ). No entanto, diferente dos projetos citados anteriormente, a função inicial do imóvel, o edifício Hilton Gonçalves dos Santos, que fica no Morro da Viúva, não era a hospedagem comercial, tendo sido usado como sede do Clube de Regatas do Flamengo durante os anos 1950. É mais um empreendimento que apresenta forte relação com a paisagem urbana da cidade, tendo vista para o Parque do Flamengo e para o Pão de Açúcar, bem na entrada da Baía de Guanabara e com fundos para o Cristo Redentor, ou seja, mais um bom exemplo de como o retrofit possibilita a reocupação de imóveis em regiões cobiçadas de grandes centros, após sua requalificação.
Outra diferença em relação aos projetos apresentados anteriormente é que, neste caso, trata-se de um condomínio de luxo, com 148 unidades, que têm metragens entre 152 e 183 metros quadrados, todas com três suítes. Além disso, o empreendimento conta com espaços de convívio e bem-estar para moradores e visitantes, personal concierge, serviço de Valet Parking e espaço coworking. Com projeto arquitetônico desenvolvido pela RAF Arquitetura, o edifício ainda conta com assinatura da YOO, uma referência em design com atuação na Ásia, África, Austrália, Europa, América do Sul e do Norte e no Oriente Médio, que ficou responsável pela decoração das áreas comuns.
Como sede do Clube de Regatas do Flamengo, o edifício teve uma história invejável, recebendo visita do ex-presidente da República Eurico Gaspar Dutra, além de outras personalidades, como o escritor José Lins do Rego, em sua inauguração, em 1953. Já na década de 1970, quando deixou de ser sede do clube, tornou-se um condomínio de luxo que também contou com moradores ilustres, como a cantora Bibi Ferreira. No entanto, chegou à década de 2000 em estágio avançado de abandono, sendo devolvido ao clube por Eike Batista, que tinha adquirido o espaço para transformá-lo em um hotel. A RJZ Cyrela, por sua vez, entrou na jogada em 2017, já com projeto de retrofit para o Rio By YOO, cujo lançamento aconteceu em 2019 e deve ser entregue em junho deste ano.
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