Fake news, Sleeping Giants e o mercado imobiliário
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Fake news: não dá para viver no mundo contemporâneo sem ter ouvido essa expressão. As notícias falsas, em tradução livre, sempre existiram, mas com a ascensão da internet, a disseminação e alcance de notícias que não são verdadeiras aumentou. “Em nível mundial, começamos a discutir o conceito de fake news com as eleições presidenciais americanas, em 2016. Já no Brasil, o tema também coincidiu com as eleições presidenciais, mas dois anos depois, em 2018”, explica o jornalista e professor da PUCPR, Renan Colombo.
O direito à informação é fundamental e constitucional no Brasil, e as fake news vão no caminho contrário disso, muitas vezes encobrindo-se de outro direito, o da liberdade de expressão. “O grande problema é que informações falsas ou enganosas fazem com que as pessoas tomem decisões simples ou complexas baseado em mentiras, em informações que não são verdadeiras. A democracia saudável pressupõe transparência, circulação de informação de qualidade, verdadeira, apurada, checada”, analisa Renan.
O termo está tão presente nas rodas de conversa pois estamos passando por um processo coletivo de compreensão deste fenômeno, com suas implicações, limitações e consequências. Há a discussão de regulamentação e punição para “propagadores de desinformação”, acompanhada de operações policiais e um Inquérito Federal, assim como a discussão de financiamento destes veículos.
Neste contexto, surgiu nos Estados Unidos, em 2016, o movimento Sleeping Giants. Consiste em um grupo de militantes anônimos que buscam combater as fake news por uma das maiores fontes de renda dos veículos de comunicação: a publicidade online. O que o grupo faz é chamar a atenção e cobrar uma posição das empresas que estejam financiando esses sites.
Chegou no Brasil, pelo Twitter, em maio de 2020. No Twitter, a página do movimento alerta grandes marcas que estão anunciando em veículos conhecidos por propagar notícias falsas, como o Jornal da Cidade Online e Conexão Política.
E qual a relação como imobiliário?
Entre as empresas acionadas pelo Sleeping Giants no Brasil, está o QuintoAndar. A chamada não é coincidência: a maioria das marcas que são acionadas são grandes, com um orçamento alto para mídia digital. No Brasil, entre as empresas que têm esse poder aquisitivo no imobiliário está justamente o unicórnio.
A head de mídia digital na CUPOLA, Aline Pavezi, explica: “O tipo de anúncio que o movimento costuma denunciar faz parte de uma estratégia de mídia chamada mídia de display, no Google. Nesta, a empresa segmenta o público que tem interesse, com filtros demográfico, de região, idade, gênero. Pode também escolher um público que esteja com buscas específicas (comprar imóvel em São Paulo, por exemplo) e optar pelo remarketing, que consiste em atingir o usuário que já esteve no seu site. O Google irá distribuir o conteúdo em sites parceiros e estes são milhares”.
A estratégia da rede de display é muito funcional para branding e posicionamento da marca. Além disso, tem um valor mais acessível e empresas de todos os portes podem investir, por isso é tão popular. O problema é que, em uma grande campanha de display, são tantos os portais que veiculam esses anúncios que fica inviável avaliar individualmente quais podem ser veículos de fake news. “Quanto maior o orçamento do cliente, maior a rede de display, maiores os sites alcançados e maior a chance de veicular em algum desses portais”, analisa Aline.
O Sleeping Giants sabe disso, e por isso age como um alerta, antes de acusar as marcas. Quando alertadas, a ação costuma ser de bloquear este site da sua estratégia – foi o que o QuintoAndar fez. “Nós não compactuamos com práticas de fake news e estamos constantemente ajustando nossa estratégia em mídias automatizadas para que isso não aconteça”, afirma José Osse, head de comunicação do QuintoAndar.
Stop hate for profit (ou pare o ódio por lucro)
Paralelamente, há um segundo movimento rolando na internet, o Stop Hate for Profit (pare o ódio por lucro, em tradução livre). A campanha foi puxada por duas ONGs americanas, a NAACP, do movimento negro, e a Anti Defamation League, que combate o antissemitismo. Esta campanha tem outro alvo: tratar diretamente com os canais de mídia. Mais especificamente, o Stop Hate for Profit pede para que marcas suspendam os anúncios em redes sociais que não têm políticas contra racismo, discurso de ódio e, também, fake news.
A The North Face e a Patagonia, marcas de moda esportiva, começaram a aderir, boicotando os anúncios nestas redes. Mas foi no final de junho que a Unilever, Coca-Cola, Starbucks, Honda, PepsiCo e Verizon (companhia de telecom americana) aderiram. Nesta debandada, o Facebook perdeu mais de 56 bilhões de dólares em valor de mercado. Mark Zuckerberg, CEO da empresa, já anunciou algumas ações, como marcar postagens com discurso político que violem suas regras e que vai “tomar medidas para proteger minorias contra abusos”. Estas medidas não foram explicitadas.
Como combater as fake news?
“As fake news se valem de uma série de estratégias de falseamento: nem sempre é uma mentira completa, às vezes é um fato retirado do seu contexto, ou que recebe uma interpretação parcial”, explica o professor Renan. Por isso, sua recomendação geral sobre como combater as notícias falsas é ter um olhar crítico e um nível de ceticismo nas informações consumidas, em outras palavras, desconfie. Além disso, Renan indica alguns passos:
- Utilize motores de busca (como o Google) para verificar a procedência da informação. Você pode fazer isso pesquisando no Google pelo título da notícia, por exemplo;
- Faça a verificação cruzada. Ou seja, busque o jornalismo profissional, que, quando feito com seriedade, é referência e tem credibilidade. Uma dica é verificar se a notícia foi repercutida em um veículo de grande porte, como G1, UOL, Estadão;
- Acesse sites de checagem de fatos (como o Boatos.org, Lupa, Agência Pública, Fato ou Fake, entre outros);
- Seja um propagador da desmentira. Quando ver um colega compartilhando uma notícia falsa, avise;
- Também se aplica aos canais que você consome. Noticie e responsabilize as redes sociais que você acessa quando souber que uma notícia é fake. Facebook, Instagram, Twitter e YouTube têm canais de denúncia próprios.
Já para as empresas, a recomendação é que elas abracem sua responsabilidade social. “O movimento Sleeping Giants dá um alerta para as empresas e a oportunidade que as empresas voltem atrás, bloqueiem estes veículos e reforcem seu comprometimento com a informação verdadeira e de qualidade”, conclui Renan.
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