O que a Loft quer com tanto dinheiro?
Resumo
Rodrigo Werneck, CEO da CUPOLA, analisa a história da Loft e o que ela pode fazer com os aportes que já somam US$ 800 milhões em 3 anos.
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Se você já se cansou de ler notícias sobre aportes de investidores na Loft, preciso lhe dizer que nesta quinta (22) a proptech abocanhou mais US$ 100 milhões, alçando sua captação de recursos à estratosférica marca de quase US$ 800 milhões desde 2018.
Diante desses números, uma pergunta que todos se fazem no imobiliário e poucos têm a coragem de verbalizar, temendo passar vergonha, é: o que a Loft faz exatamente?
Embora alguns possam falar com aparente desenvoltura sobre a Loft, a resposta a esta pergunta ainda é obscura.
Vamos, portanto, começar eliminando hipóteses, o melhor jeito de encarar equações complexas.
A largada atuando na condição de iBuyer, há 3 anos, definitivamente não é o centro da estratégia de consolidação da Loft.
O modelo de iBuyer serviu como poderosa alavanca de partida, tornando a marca Loft presente na rotina de corretores, imobiliárias e vendedores de imóveis em São Paulo.
A atuação como iBuyer, no entanto, claramente limitou-se a isso: uma arrancada de forte impacto.
A Loft conseguiu chegar ao mercado com visibilidade, atraiu tráfego e olhares para a sua plataforma, mas o fato é que o modelo de iBuyer é um business difícil de ser escalado.
Nos Estados Unidos, embora já tenha chegado a representar 10% dos negócios realizados em algumas cidades, o modelo foi à lona durante a pandemia, como mostra o gráfico de vendas dos três principais operadores locais.
Identificar as melhores ofertas, comprar, reformar e devolver imóveis ao mercado com rentabilidade e em larga escala é uma operação, além de complexa, altamente suscetível a flutuações de mercado.
A principal razão da derrocada do modelo nos Estados Unidos é que, diante do aquecimento recorde dos negócios no imobiliário, os iBuyers não conseguem mais comprar imóveis nos preços desejados.
É simples: está faltando mercadoria nas prateleiras, pois os vendedores estão empoderados e, ao mesmo tempo, temerosos de vender o seu imóvel sem conseguir engatar outro bom negócio na compra de uma nova moradia.
Aos olhos dos investidores da Loft, porém, operar um iBuyer em São Paulo significou algo especial: demonstrou a maturidade de gestão e a capacidade dos cofundadores de realizar.
Lembre-se que a Loft tem apenas três anos de existência.
O pouco tempo de vida poderia produzir desconfiança entre os investidores, mas seguramente rodar o iBuyer ajudou a dissipar incertezas, e de quebra colocou a empresa na vitrine.
Se não é iBuyer, então o que é a Loft?
Ao se apresentar como potencial compradora de imóveis à venda, as atenções do mercado paulistano se voltaram para a Loft.
A empresa passou a encaminhar diariamente um sem-número de propostas de compra a imobiliárias e corretores.
O volume de imóveis de fato comprados e revendidos pela Loft, desde então, é ínfimo, apenas 450, mas…
O mais importante é que, em vez de ir em busca dos imóveis, ela passou a ser intensamente buscada, além dos operadores do mercado, pelos vendedores.
Aqui, preste atenção, temos uma virada no modelo.
Se nem todos os imóveis ofertados à Loft eram comprados, o que a startup poderia fazer com as ofertas declinadas?
Começou a surgir, então, uma faceta mais clara do que realmente a Loft almeja ser: um marketplace.
A proptech passou a captar imóveis à venda, e a construção de um inventário cada dia maior tornou-se sua prioridade.
Hoje, a plataforma já promove a divulgação de 12.500 apartamentos em São Paulo e Rio de Janeiro, o que pode lhe levar a crer que a Loft seria, portanto, um portal imobiliário, certo?
Errado.
A definição mais precisa deste modelo é ser uma plataforma transacional, onde clientes finais, corretores e imobiliárias possam cadastrar seus imóveis de forma ordenada (sem a multiplicidade de anúncios de um mesmo imóvel), onde visitas possam ser agendadas pelos potenciais compradores e acompanhadas por profissionais parceiros, e onde a transação possa ser concluída com acesso facilitado a crédito e suporte completo até a conclusão da etapa de documentação, resultando em uma experiência com menos fricção.
O desafio é ousado, mas dinheiro à mesa não falta (nem capacidade para seduzir fundos de investimento), e a Loft não está sozinha na construção deste modelo.
Cada uma com as suas particularidades, QuintoAndar e OLX caminham em direção semelhante.
A QuintoAndar, não mais restrita à locação, é quem está um passo à frente nesta corrida, pois conseguiu vingar o modelo no aluguel, onde as receitas são significativamente menores.
No entanto, a gigante do aluguel enfrenta um grande obstáculo: dobrar a resistência das imobiliárias, que acabaram demonizadas pela imprensa dentro da sua estratégia de relações públicas.
Sim, as imobiliárias têm seu valor nesta construção, algo a que a QuintoAndar se deu conta.
Parte significativa do inventário, atualmente, está nas mãos delas, e quem for capaz de trazê-las para dentro do modelo, tornando o projeto “desejado”, largará em vantagem expressiva.
A Loft também enfrenta arestas no relacionamento com as imobiliárias, que a observam com desconfiança, temendo perder os seus corretores de imóveis.
O temor tem fundamento.
Ao explicar porque vem apostando na Loft, inclusive tendo liderado a série A em 2018, o poderoso fundo de investimentos do Vale do Silício Andreessen Horowitz (a16z) destaca as comissões bilionárias que os clientes pagam por uma “experiência terrível”.
Um imobiliarista de São Paulo, certa vez, me disse que se sente participando de um teste A/B dentro da relação com a Loft: “uma hora parece que eles querem fazer negócio comigo, outra hora parece que o foco é o corretor, eles são contraditórios”.
A OLX, por conta da relação mais distendida com as imobiliárias, é um player bem posicionado (e capitalizado) à mesa, mas desde a compra do Grupo ZAP, em 2020, fez movimentos considerados tímidos e até agora nada de concreto apresentou ao mercado.
O pouco que se sabe, no momento, é que o foco inicial da OLX, em termos transacionais, será a locação, área em que a Loft também já está se aventurando através da Nomah, empresa recentemente adquirida que almeja encerrar o ano com 1.000 imóveis sob gestão.
Conclusão
A partir desses elementos, me permito trazer algumas conclusões sobre a Loft e seus concorrentes diretos:
1. Os corretores de imóveis são indispensáveis no modelo que a Loft está construindo. E o assédio sobre eles será crescente, tornando-os produto de disputa com as imobiliárias e a QuintoAndar, em especial, enquanto a OLX ainda não evolui o seu formato de plataforma.
2. O papel das imobiliárias para a Loft, no atual desenho, ainda é incerto. O certo, por enquanto, é que elas ainda precisam ser convencidas de que divulgar seus imóveis na Loft representa um bom negócio.
3. Ainda que os players à mesa sejam gigantes, o mercado é grande demais e possivelmente haverá espaço para todos (mas não se surpreenda se houver uma aquisição entre eles, ou se o Mercado Livre entrar no circuito comprando uma dessas empresas). Nenhuma delas, a propósito, está olhando para o interior e capitais menos expressivas.
4. Seguramente a Loft fará mais aquisições em curto ou médio prazo.
5. Não perca tempo discutindo se ou quando a Loft terá lucro. O jogo deles é outro. E possivelmente mira um IPO, para o qual a forte capitalização com dinheiro de investidores contribui vigorosamente.
6. Os portais imobiliários, com a sua experiência questionável aos olhos dos usuários, terão de se reinventar para continuarem existindo com protagonismo.
O certo, neste cenário, é que não sofreremos de tédio.
Consultor e especialista em Marketing Imobiliário, Rodrigo Werneck é sócio-fundador e CEO da CUPOLA, consulgência exclusiva para o setor imobiliário, com clientes nas cinco regiões do Brasil.
Tudo certo! Continue acompanhando os nossos conteúdos.
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