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Opinião

Férias chegando: cuidados para que a locação por temporada seja fácil e funcione

*Por Jaques Bushatsky

É cena de muitas comédias – embora às vezes dramáticas as situações reais – a família chegando à casa em que passará as férias, num carro abarrotado, a criançada excitadíssima, os pais um tanto esgotados devido à viagem (está chegando?) e à gritaria, pela inacreditável quantidade de pacotes, geladeiras, bicicletas a descarregar.

E aí, a casa! Se for adequada, estará tudo bem. Mas, se não for… as férias infernais começarão: já vi casos de ilha em Paraty a uma hora de barco e sem água potável (e lógico, ninguém avisou); casa no campo com quatro dormitórios, mas somente uma cama; chácara linda, mas com indisfarçável criação de porcos e indistinguível de seus odores; apartamento no décimo andar em prédio com dois dos três elevadores em reforma … Se fizermos uma enquete entre os leitores vamos descobrir casos e mais casos.

Ora, a você que vai alugar um imóvel para estas férias, convém observar que a lei das locações contém algumas previsões que, bem entendidas e respeitadas, permitem tranquilidade na locação para temporada. E a você administrador de locações, está aberta a oportunidade de atuar muito bem.

A primeira providência que o locatário deve tomar é visitar o imóvel: parece curioso, mas muitos ajustam essas locações, pagam valores a cada ano mais significativos, mas não sabem onde vão passar as férias! Neste ano de quase pós pandemia, por exemplo, muitos apostaram que a Peste duraria, viagens para fora do país ou para resorts seriam difíceis, e arriscaram preços altíssimos, mas não checaram o que alugaram. Problemas à vista, é lógico. 

De duas, uma: ou você vai visitar o imóvel ou, então, você deve celebrar a locação através de uma imobiliária local, que poderá resolver eventual insatisfação com o imóvel, além de prestar assistência em caso de qualquer crise. E os problemas são variados, devendo sempre ser lembrado que o proprietário estará longe! Quem mais resolveria o vazamento de água, o fogão quebrado, o ar condicionado com defeito?  Sim, sou convicto em preferir alugar através de imobiliária local.

Evite aborrecimentos e não se fie na possibilidade de alugar verbalmente: elabore um contrato por escrito, é uma providência singela e você sabe, palavras voam. 

É costumeiro o uso de um contrato simples, no qual devem constar, sanando preocupações e constrangimentos tanto do locador quanto do locatário: 1) as datas de início e término da locação; 2) o preço combinado; 3) o local do imóvel; 4) a descrição dos bens que o guarnecem (declarando-se em que estado estão sendo entregues tais bens); 5) as garantias de perfeito cumprimento; 6) a obrigação de respeito às normas do condomínio e às normas da Associação de Moradores, arcando com as penalidades impostas pelo eventual mau uso; 7) que o locatário não poderá sublocar, emprestar ou ceder, inclusive a familiares, o uso do imóvel, no todo ou em parte; 8) a quantidade máxima de pessoas que poderão ocupar o imóvel; 9) a proibição (se for o caso) de manter animais na casa; 10) que o locatário fará por sua conta, imediatamente, todas as reparações de estragos a que der causa. 

Não são utilizadas as garantias locatícias usuais (fiador, seguro de fiança, caução), até porque é costume receber-se o aluguel antecipadamente, o que é permitido pela lei (embora não seja obrigatório).

Muito importante: locador e locatário devem fazer duas vistorias, uma na entrada e outra na saída. A primeira resume-se a uma lista, assinada pelos contratantes (ou por seus representantes, quando novamente é bom ser acompanhado por uma imobiliária local), relacionando os bens, bastando declarar que estão em bom estado de conservação e identificar o que estiver quebrado ou em mau estado. O mais importante é a relação dos equipamentos, que são caros. O objetivo é um, apenas: eliminar qualquer dúvida sobre o que está no imóvel e se existe algo quebrado. Lembre-se de usar a câmera fotográfica, é fácil e as fotos servirão de prova excelente, em caso de discussão. 

Quando for devolvido o imóvel, caso esteja tudo em ordem, bastará uma declaração nesse sentido e, o que for danificado, deverá ser indenizado. Essa simples providência eliminará a maior parte das chateações que ocorrem nessas locações. 

Outro costume consagrado é a emissão de um título de crédito para caução, em garantia dos bens que estão no imóvel, título que deverá ser devolvido ao locatário ou anulado, após a devolução, realizada a segunda vistoria. A importância corresponde a uma estimativa do valor dos móveis e equipamentos instalados. Até há pouco, se costumava usar cheque, um documento que talvez os mais jovens nunca tenham visto. Atualmente se usam notas promissórias (que mencionam a razão de sua existência); depósitos (cauções) em garantia; declarações de responsabilidade e autorização de gasto pela imobiliária para a reposição necessária, desde que documentados danos, gastos e, ainda, limitados os valores. 

A prática tem conduzido a elaboração desses documentos e o uso das modalidades, mas se tudo der errado, sempre estará o caminho judicial, a aumentar a relevância da documentação (contrato e vistorias).

Locação por temporada em condomínio

Se o imóvel for uma unidade em condomínio, mais alguns pontos merecem lembrança: Primeiro, existem regulamentos ou síndicos que proíbem aos locatários a utilização de quadras, piscinas, saunas e etc. Por mais ilegais que sejam essas proibições, é evidente que você não deseja dedicar as férias a desgastantes debates jurídicos (com o zelador ou com qualquer preposto do Condomínio) sobre o direito ao uso da churrasqueira, por exemplo.  Vale a pena esclarecer antes a questão e fazer constar no contrato o direito ao uso das partes comuns. Em caso de reclamação, bastará mostrar o contrato e solicitar que o reclamante se dirija ao proprietário.

Segundo, em condomínios o locatário deverá observar as regras de convivência e de utilização, nada diferentes do que ocorre na residência de qualquer um: horário de funcionamento dos equipamentos comuns, horário em que o silêncio será desejável, local para guarda de veículos e assim por diante. Um realce: se o locatário desrespeitar as regras do condomínio, o condômino (o locador) poderá ser multado e essa multa, depois, será cobrada do locatário. 

Vez por outra surgem desavenças entre um condômino (ou um vizinho) e o locatário, algumas pessoas são férteis na criação de casos. Nessas situações, é evidente que o locador nada terá com isso e, assim, eventuais direitos deverão ser buscados ante o efetivo culpado. Por exemplo, se um vizinho injuriar o locatário, este deverá tomar as providências criminais e cíveis ante o vizinho agressor.

Terceiro: alguns condomínios entendem de proibir a locação através de aplicativos, talvez preferindo aqueles anúncios antigos (o Estadão, tradicional jornal paulista, passou a publicar curiosas propagandas de 100 anos atrás – vale a diversão, dificilmente a repetição). Sem entrarmos na discussão, convém que os interessados sejam diretos: locatário, pergunte e obtenha por escrito do locador a declaração de que nada, nas regas do condomínio,  impede essa locação!  

Esse “nada impede” (os advogados antigos diriam “nihil obstat”) englobará, igualmente, a eventualmente existente limitação de período (alguns entendem de proibir locações com menos de determinada quantidade de dias – também não discutiremos aqui a legalidade disso, tão somente vamos viabilizar a locação)

Uma dúvida frequente: o que ocorrerá se o locatário não sair do imóvel na data combinada? O locador poderá imediatamente promover uma ação de despejo (e obter uma liminar). Se, porém, o locador nada fizer, a locação será prorrogada (pelo aluguel ajustado) e o imóvel somente será retomado após 30 meses. Pense comigo: considerando que na temporada o aluguel é muito mais alto do que no restante do ano, esse acontecimento poderia ser um verdadeiro prêmio para o locador, por isso é uma situação extremamente rara.

Convém destacar: as imobiliárias têm prestado excelentes serviços nessa área e, para o locatário, não há acréscimo no custo, vale a pena contar com elas; para o locador, a presença de uma boa imobiliária é um verdadeiro bálsamo, pois a um custo reduzido, cuida de tudo que cerca essa operação. 

Essa menção a “tudo que cerca” não é semântica: imobiliárias locais cuidam dos contratos, dos problemas que surjam no imóvel, reparos urgentes, vistorias, eventuais (sempre terríveis e irritantes) estranhamentos entre o locatário e vizinhos e zeladores; enfim tudo que possa prejudicar as férias – do locatário ou do locador.

A atenção a estes pequenos lembretes permitirá a tranquilidade da estadia num imóvel alugado, opção cada vez mais utilizada. Ao locador, um bom negócio; ao locatário, boas férias!

Jaques Bushatsky

Jaques Bushatsky é advogado, foi Procurador do Estado de São Paulo e Juiz do TIT/SP por dois mandatos e chefiou a Procuradoria da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. Coordenador de Locação e Compartilhamento de Espaços na Comissão de Direito Imobiliário da OAB/SP. No SECOVI – SP (Sindicato da Habitação) é membro do Conselho Jurídico da Presidência, Diretor de Legislação da Locação, Coordenador do PQE e Pró Reitor da Universidade corporativa.

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Jaques Bushatsky

Jaques Bushatsky é advogado, foi Procurador do Estado de São Paulo e Juiz do TIT/SP por dois mandatos e chefiou a Procuradoria da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. Presidente da Comissão de Locação e Compartilhamento de Espaços do IBRADIM – Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário, fundador e diretor da MDDI – Mesa de Debates de Direito Imobiliário. Autor da obra “Aspectos Principais do Aluguel Comercial” e coautor da obra “Locação Ponto a Ponto” publicada pelo IASP Instituto dos Advogados de São Paulo.

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