Imobiliárias

Rotina de “funcionário” pode caracterizar vínculo trabalhista do corretor autônomo

Reduzir a incidência de conflitos trabalhistas é um dos objetivos na gestão de qualquer empresa, ao passo que os empregados devem estar atentos aos seus direitos. Numa imobiliária de locação, o calcanhar de aquiles é a classificação do corretor autônomo como empregado – ao lado do pagamento de horas extras, uma demanda muito comum em companhias de diversos segmentos.

corretor autônomo

É frequente em imobiliárias de todo o país a presença de corretores com contrato de autônomo e representados por uma microempresa (frequentemente como MEI). Mas o que determina perante a Justiça do Trabalho seu vínculo empregatício é a maneira como esse corretor exerce sua função no cotidiano.

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prevê quatro condições básicas para caracterizar o vínculo trabalhista: habitualidade (estar disponível à empresa diariamente ou quase todo dia); subordinação (se recebe ou não ordens); onerosidade (se recebe salário ou comissões fixas); e pessoalidade (se o contrato é exclusivo com aquela pessoa). Ambas as partes devem estar atentas ao cumprimento dessas premissas para evitar dissabores.

Para discutir este tema sensível, o Imobi Report entrevistou a advogada Karina Negreli, gerente do departamento Jurídico do Secovi-SP. Confira.

IMOBI REPORT: Quais tópicos do contrato de prestação de serviço com o corretor autônomo podem caracterizá-lo como empregado?

Karina Negreli: O exercício da corretagem pode ser regido por diversas modalidades contratuais, entre as quais o contrato de prestação de serviços, o contrato de corretagem em geral, ambos previstos no Código Civil e caracterizados pela independência entre as partes, e ainda o contrato de autônomo exclusivo, modalidade inserida pela Reforma Trabalhista na CLT, em 2017. Esses instrumentos, estando alinhados a uma real autonomia, se diferenciam do contrato de emprego típico, marcado sobretudo pela subordinação e dependência.

A corretagem imobiliária, por sua vez, conta com instrumento ainda mais específico previsto na lei 13.097/15 que, ao alterar o art. 6º da lei 6.530/78, consolidou no mundo jurídico a figura do corretor de imóveis associado, formalizando o que na prática atendia muito bem a realidade do mercado.

O contrato de corretor associado deverá ser feito por instrumento escrito, especificando a natureza da contratação (contrato de associação para corretagem na forma do art. 6º, §2º da lei 6.530/78), ajustada entre o corretor pessoa física e a imobiliária, devendo ambos contar com registro profissional válido perante o conselho respectivo e dispor claramente sobre a autonomia profissional do corretor, especificando-se a forma como as partes deverão desempenhar as funções relativas à intermediação imobiliária, fixando os critérios para a partilha dos resultados da atividade de corretagem.

Convém ainda mencionar no instrumento que o contrato de associação não implica troca de serviços, pagamentos ou remunerações entre a imobiliária e o corretor de imóveis associado, sendo a remuneração das partes independente e feita geralmente por parte do adquirente do imóvel.

O instrumento contratual de associação deverá ser levado a registro no Sindicato dos Corretores de Imóveis ou, onde não houver sindicato instalado, registrado nas delegacias da Federação Nacional de Corretores de Imóveis, que deverão prestar obrigatória assistência no ato do registro.

IMOBI: Que comportamentos por parte da imobiliária em relação ao corretor autônomo podem caracterizar o enquadramento dele como celetista?

Karina: O princípio da boa-fé objetiva e da primazia da realidade devem estar presentes em qualquer relação jurídica contratual. Assim, num contrato de associação típico, de prestação de serviços autônomos ou de corretagem em geral, as obrigações deverão ser cumpridas pelas partes na forma pactuada, preservando-se na prática do dia a dia a essência da natureza de independência e autonomia próprias do contrato. A presença de subordinação é a característica mais marcante do trabalho celetista, traduzida em especial pelo poder disciplinar do contratante.

É recomendável a adoção de cuidados até mesmo na fase pré-contratual, evitando que os anúncios para captação dos corretores associados passem a ideia ou expectativa de um contrato celetista, deixando sempre clara a natureza da relação associativa existente. Os materiais de apresentação do corretor não devem passar a visão de que o profissional atua como preposto da imobiliária, mas sim como seu parceiro, constando de cartões de visitas ou folders com sua identificação tratar-se de associado da imobiliária, por exemplo.

IMOBI: Em caso de acidente durante deslocamento a trabalho, que direitos o corretor autônomo tem em relação à assistência do contratante?

Karina: Nesse tipo de situação, considerando não estar configurada a relação empregatícia, não cabe à imobiliária contratante o pagamento de qualquer remuneração ao autônomo. Se o profissional estiver inscrito no INSS como contribuinte individual e ficar comprovada a incapacidade para o exercício de sua atividade, ele deverá dar entrada diretamente junto à Previdência Social no seu pedido de benefício por incapacidade. 

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Parte deste conteúdo foi publicado originalmente no Imobi Aluguel, primeiro relatório de inteligência do país focado exclusivamente em locação. Em cada edição, o Imobi Aluguel traz um estudo sobre um tema principal, entrevista em áudio, notícias ligadas ao segmento e indicadores atualizados da locação. Clique aqui para receber o Imobi Aluguel gratuitamente por 7 dias e saber mais sobre o relatório, produzido pela equipe de jornalistas do Imobi Report, com o know-how da CUPOLA, maior consultoria para gestão de imobiliárias do Brasil.