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Os jovens arquitetos e o futuro do morar

Neste mês, tive o prazer de conversar com jovens arquitetos que se destacam pela linguagem e trabalho executado.

O bate-papo com Pedro Domingues, sócio do VAGA, com Gabriela Mestriner, cofundadora do Flipê Arquitetura, e com Almiro Dias e Ana Paula Zonta, sócios do escritório Almiro Dias Arquitetos, foi um momento importante para falarmos sobre nossas percepções em relação ao futuro da arquitetura na cidade de São Paulo.

Todos eles possuem em comum uma forte valorização da arquitetura brasileira, utilizando-a como base para seus projetos contemporâneos e inovadores. Leia mais nesta pequena entrevista:

1. Como jovem arquiteto/a, a que você credita ter chegado a essa posição de ser um novo talento da arquitetura brasileira?

Pedro Domingues: No VAGA tratamos cada oportunidade com igual seriedade, profundidade conceitual e rigor técnico, independente da natureza do projeto, trabalhando dentro uma grande variedade de escalas e programas, mas sempre movidos pelo propósito de traduzir sonhos em atmosferas e espaços impactantes, sensíveis e eficientes.

No nosso processo criativo, refutamos respostas pré-concebidas e encaramos cada projeto como uma oportunidade única, trabalhando com o intuito de encontrar a essência singular de cada projeto a partir de respostas assertivas às questões inicialmente apresentadas pelos clientes, pelo território e outras questões relevantes. Acreditamos que os espaços que projetamos que ganharam relevância e destaque foram eficientes em traduzir ideias concretas e abstratas em atmosferas singulares de forte identidade.

Gabriela Mestriner: Acredito que através do traço autoral marcante das nossas criações, que vai além da linguagem de projeto e estética arquitetônica, parte de valores e propósitos consistentes, criando de forma multidisciplinar e sempre com uma perspectiva orgânica. Temos na Flipê um olhar de cuidado para a individualidade de cada projeto e respeitamos a complexidade do contexto em que estão inseridos. Nossa trajetória profissional é marcada pela experimentação em diversas áreas e escalas, permeando a arquitetura, design de interiores, cenografia e design de móveis, o que resulta em projetos multidisciplinares, com olhar atento para diversas escalas.

Nossa atuação busca o sentido contrário de uma lógica homogênea, neutra e impessoal, que muitas vezes segue tendências e reproduz preexistências. Criamos espaços que representam a vida e a personalidade de cada usuário, no contexto de cada projeto, para o nosso tempo. 

Não temos amarras de escolas arquitetônicas ou referências reproduzidas, acreditamos que as novas gerações devem aprender como o legado de outros tempos, mas têm o compromisso de pensar o hoje. Por isso buscamos um novo universo para cada projeto, único em suas particularidades, que merecem que as soluções também sejam. Nossa mensagem está na sensação, no bem-estar, no propósito. Acreditamos no poder de uma arquitetura pensada com afeto, buscando criar espaços para experiência e pertencimento, soluções sustentáveis, multifuncionais e capazes de se adaptar a novas realidades. Somos parte de um coletivo que valoriza essa intenção e busca essa realidade para suas vidas. 

Almiro Dias e Ana Paula Zonta: Como arquitetos em crescimento, acredito que ter chegado aonde estamos hoje é fruto de uma combinação de fatores. Em primeiro lugar, nossa abordagem em criar projetos minimalistas e modernos, porém práticos e utilizáveis. Além disso, contamos com uma equipe qualificada e comprometida com a ética profissional e com a qualidade dos projetos e da gestão de obra. 

Outro fator relevante é a nossa premissa em utilizar texturas e materiais naturais, como concreto, tijolo, madeira e mármore, de forma a criar ambientes elegantes e sofisticados. Também somos adeptos de divisórias em vidro canelado, que trazem uma sensação de leveza e modernidade aos espaços. 

Por fim, acreditamos que nossa habilidade em gerenciar o processo de projeto e obra, transformando as ideias do papel em realidade, é fundamental para nosso sucesso no mercado. Ao combinarmos uma abordagem criativa e moderna com uma gestão eficiente, conseguimos criar projetos de alta qualidade que atendem às expectativas dos nossos clientes.

2. Quais suas referências e influências na arquitetura?

PD – Somos fortemente influenciados pela arquitetura brasileira, não somente a erudita, mas também pelas construções populares e vernaculares. Também nos identificamos com a arquitetura portuguesa tradicional e moderna, certamente pela influência na nossa história e cultura. Além disso, frequentemente recorremos em pesquisa a projetos latino-americanos, especialmente mexicanos, que muitas vezes se deparam com condicionantes semelhantes à nossa realidade, tendo forte relação com o território e com a natureza. 

Por fim, nos interessamos fortemente pela produção japonesa contemporânea que reflete valores e relações específicas de uma sociedade cujas particularidades geram uma noção e relação com o espaço construído totalmente singular.

GM – São muitas as referências que admiramos e que trazemos na nossa trajetória como inspiração, cada um por um motivo. Seja pelo traço, por seus princípios ou por marcarem um tempo relevante na arquitetura nacional. Também temos grande influência de outros campos da arte e da fotografia. Acreditamos que tudo que vemos é potencial e ferramenta para inspirar o novo.

Tenho uma admiração particular pela Lina Bo Bardi, que vai muito além da sua excepcional produção arquitetônica. Admiro como mulher e artista multidisciplinar, que atuou sempre fiel aos seus propósitos e valorizando a diversidade da nossa cultura. Criou em muitas escalas, ocupou muitos espaços, em tempos com ainda menos protagonismo para as mulheres, abrindo muitas portas.

Também sou uma grande admiradora da arquitetura contemporânea da Coreia do Sul, que traz muita inovação no traço limpo, com muita qualidade funcional e harmonia estética.

Assim como a arquitetura mexicana, que valoriza tão bem o entorno e a cultura local. Tenho muitas referências nacionais, inclusive na arquitetura ainda em produção. Há muita qualidade no trabalho sendo feito hoje por nossos colegas de profissão e acredito que inspiração e admiração também devem ser uma troca contínua e atual.

AD e AZ – Como arquitetos, nossas referências e influências são muito diversas e vindas de diferentes épocas e estilos. De um lado, admiramos muito a arquitetura moderna brasileira dos anos 50 e 60, que foi tão importante para a história brasileira e influenciou muitos de nossos projetos. Arquitetos como Niemeyer, Franz Heep, Artacho Jurado e Paulo Mendes da Rocha são alguns dos nomes que admiramos muito e cujas obras vemos todos os dias em nossos caminhos de casa até o trabalho.

Ao mesmo tempo, gostamos de nos inspirar em escritórios de arquitetura mais novos e contemporâneos, especialmente no Brasil, que estão ajudando a definir a linguagem arquitetônica do país neste momento. Acreditamos que é importante estar sempre atento às tendências e novidades do mercado e, em particular, ver o que os arquitetos mais jovens estão criando.

Em termos de estilo, não temos um apego específico a uma escola ou corrente arquitetônica.

Preferimos pensar que estamos criando nossa própria linguagem, uma mistura de várias influências e estilos que refletem nossa visão única e nosso amor pela arquitetura. Gostamos de trazer uma “bossa” para nossos projetos, criando uma atmosfera única e especial que é ao mesmo tempo elegante e acolhedora.

3. Como você avalia o futuro do morar em nossas cidades?

PD – Vivemos em um mundo cuja população urbana cresce exponencialmente, fazendo com que a questão do habitar seja sempre uma pauta relevante, especialmente em um país como o Brasil em que há um alto déficit habitacional. 

Para encararmos a questão habitacional de forma eficaz, são necessárias soluções integradas e inteligentes, tanto na escala do edifício quanto na escala urbana, tendo como foco principal o bem-estar e a qualidade de vida das pessoas. Acreditamos que o futuro do morar em nossas cidades dependerá da capacidade humana em adotar e implementar soluções inovadoras, sustentáveis e tecnologicamente avançadas que ajudem a melhorar a qualidade de vida dos cidadãos e permitam uma gestão eficiente dos recursos.

GM – Acreditamos em um futuro que prioriza a qualidade de vida de pessoas, de forma

individual e coletiva. E uma abordagem mais sustentável é urgente e indispensável para todas as áreas. Quanto ao morar, cabe a nós pensar esse futuro. Temos algumas ferramentas e profissionais que dedicam uma vida a pensar esse tema, mas são muitas as variantes e possibilidades, que não podemos prever hoje. 

Acredito que nosso compromisso é fazer o nosso melhor pela cidade que podemos construir no presente, garantindo que seja um bom legado para as gerações futuras, não um recorte de tempo perecível. Permitir que a arquitetura não seja rígida, projetando para que essa tenha as ferramentas necessárias para permear muitas possibilidades, em anos, décadas, é nossa responsabilidade como geração, e um presente possível para o futuro do morar. 

Cada projeto que serve seu propósito não é estático. O espaço não existe por si só, depende do quem, como e quando. Acredito que devemos partir de um olhar empático para quem vive nos espaços que projetamos, e do cuidado de entender projetos como parte de um sistema mais complexo, social, sempre e cada vez mais de forma sustentável.

O melhor presente que podemos deixar para uma cidade é uma arquitetura que seja potencial, capaz de se adaptar e envelhecer bem. Temos o compromisso e a responsabilidade de um legado sustentável para as gerações futuras, mas não precisamos determinar como vão viver.

AD e AZ – Acreditamos que o futuro do morar em São Paulo será cada vez mais orientado para espaços compactos e inteligentes, que se adaptem às diferentes necessidades e estilos de vida dos moradores. A cidade já tem uma forte tendência de verticalização, o que demanda projetos de arquitetura cada vez mais inovadores e funcionais.

Vemos que a arquitetura precisa estar preparada para acompanhar as mudanças na sociedade e na forma como as pessoas vivem, buscando soluções criativas e eficientes para problemas como a falta de espaço e a convivência em ambientes cada vez mais densos. Uma das principais tendências que estamos vendo é a crescente demanda por espaços mutáveis, que possam ser adaptados de acordo com as necessidades e preferências dos moradores.

Acreditamos também que a arquitetura pode desempenhar um papel fundamental na criação de ambientes urbanos mais saudáveis e sustentáveis. Isso inclui desde a escolha de  materiais e técnicas de construção mais eficientes, até o planejamento de áreas verdes e espaços públicos que promovam a convivência e o bem-estar da população.

4. O que você gostaria de ver na arquitetura dos empreendimentos para atender esse futuro?

PD – Acreditamos no potencial da arquitetura como ferramenta transformadora do mundo em que vivemos e gostaríamos de ver bons exemplos de projetos habitacionais para todas as faixas de renda. Além de atender as demandas diretas de seus usuários, um bom projeto deve ter um senso de responsabilidade com a cidade, a natureza e com os recursos disponíveis. Vemos que os incorporadores que têm investido em bons projetos têm se destacado no mercado, além de estarem construindo empreendimentos que geram impactos positivos não só a seus moradores, mas à cidade como um todo.

GM – Principalmente, gostaria de ver uma cidade pensada para as pessoas, não para o mercado. Gostaria de ver empreendimentos projetados com cuidado para cada entorno em que se coloca, respeitando as individualidades, as preexistências, o convívio e a comunidade local. Precisamos, como geração, não reproduzir uma homogenia, ver o mesmo edifício, em todos os lugares. 

Perdemos muito do nosso potencial criativo e cultural generalizando soluções. Precisamos pensar o sustentável em todas as pequenas escolhas e a arquitetura é um conjunto de muitas alternativas; é o olhar. Por isso, buscamos sempre fazer escolhas com consciência, priorizando materiais que tenham uma maior durabilidade, muitas vezes pouco utilizados hoje, vistos como de outros tempos, mas que trazemos com um novo olhar.

A inovação muitas vezes está em uma nova forma editada, e não necessariamente depende da tecnologia, principalmente se essa ainda não é a realidade no mercado que atuamos. Buscar evitar resíduos e priorizar a durabilidade é um grande presente para o futuro do morar. Acredito que somos parte de uma geração que busca uma maior consciência, que tem essa responsabilidade, de repensar as consequências do consumo irresponsável de recursos e de voltar o olhar para a qualidade da relação entre homem e o meio em que vive.

AD e AZ – Gostaríamos de ver uma arquitetura mais autêntica nos empreendimentos do futuro, com fachadas ativas de qualidade, apartamentos compactos, porém confortáveis, e plantas inteligentes que permitam uma maior personalização dos espaços. Acreditamos que podemos ter prédios mais interessantes e distintos na paisagem urbana, que reflitam a diversidade e a identidade cultural das cidades. 

Com uma abordagem mais consciente e criativa, podemos construir empreendimentos que atendam tanto às necessidades dos moradores como às expectativas do mercado imobiliário.

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Em todas as respostas, percebemos o quanto a preocupação com o urbanismo foi destacada como fundamental, além da busca por criar espaços que promovam a convivência, a mobilidade sustentável e a preservação do patrimônio histórico e cultural.

É notável que todos esses elementos juntos são importantes para a criação de projetos arquitetônicos que são ao mesmo tempo esteticamente agradáveis, funcionais e sustentáveis, contribuindo para a construção de cidades mais humanas e saudáveis.