Imobi Report

Metodologias Ágeis: a transformação através do “Daily”

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Rotina de breves reuniões diárias ajuda empresas imobiliárias a entender suas próprias dinâmicas e a aprimorar o espírito de equipe e a sensação de pertencimento

À primeira vista, pode parecer um contrassenso o fato de uma rotina de reuniões diárias estar entre as principais recomendações das Metodologias Ágeis. Afinal, ainda é arraigada no mundo corporativo a visão de que o excesso de debates atravanca os processos por afastar o colaborador de suas atribuições mais práticas. Porém, empresas do mercado imobiliário que adotaram o chamado “Daily” mostram que o tempo investido em conversas e exposições individuais redunda em transparência, controle e espírito colaborativo, o que comumente se reverte em resultados práticos.

As chaves para diferenciar o Daily de uma reunião tradicional são a duração e o foco. Os encontros de rotina dentro do Scrum e de outros métodos ágeis costumam durar entre 15 e 30 minutos. Neles, cada membro da equipe relata brevemente o andamento de seu de trabalho, narra suas dificuldades e sugere aprimoramentos. Após todos compartilharem seus feitos ou dores, tudo de forma muito objetiva, o líder media as discussões e, se for o caso, atua imediatamente para remover obstáculos e otimizar o dia de trabalho de seu Squad.

Trata-se, portanto do cumprimento dos três pilares do Scrum, a mais difundida Metodologia Ágil do mercado: transparência, inspeção e adaptação.

São Bento desmistificou visão de “fórmula mágica”

Tal possibilidade de evolução inspirou a incorporadora São Bento, com sede em Dourados (MS) e dona de diversos empreendimentos em Mato Grosso do Sul e Mato Grosso, a aplicar essa rotina desde meados de 2019. O sócio-diretor da empresa, Victor Messias, conta que ficava incomodado quando as reuniões semanais ou quinzenais identificavam os problemas tardiamente, gerando atrasos e retrabalhos.

Em busca de soluções para este e outros entraves organizacionais, Messias descobriu o Scrum e se encantou tanto com o método que, além de implantá-lo na empresa, deu a cada funcionário uma cópia de “A Arte de Fazer o Dobro do Trabalho na Metade do Tempo”, do americano Jeff Sutherland, livro que é considerado o marco inaugural do Scrum no mundo.

O empresário admite que, de início, alguns colaboradores mostraram certa desconfiança sobre a nova dinâmica de encontros e o funcionamento do que parecia ser uma “fórmula mágica” de gestão. Hoje, as reuniões de 15 minutos no começo do dia, que discutem as Sprints (blocos pequenos de tarefas) da vez, tornaram-se a chave da agilidade obtida pela incorporadora.

“Não passo 24 horas sem saber que algo está fora de escopo, e agora posso mudar imediatamente a direção da equipe”, relata Messias. Outra vantagem prática, afirma, é possibilidade de prevenir obstáculos. “Como trabalhamos muito com liberações do poder púbico, se alguma etapa demora para sair, cuidamos nas reuniões diárias para que todo o resto ande à frente”. Como resultado, ele conta que as demandas que antes levavam um mês agora duram em média uma semana.

Disciplina transformou a Terraz

Além das questões práticas, a rotina Daily pode propiciar impactos mais profundos na própria cultura da empresa. Ao colocar a equipe para falar todos os dias, abre-se não apenas uma janela de transparência, mas a própria mecânica e as relações internas são naturalmente reavaliadas pelo simples fato de serem debatidas. É um processo de autoconhecimento corporativo.

Assim, os colaboradores adeptos do Daily passam a ter um senso de pertencimento muito forte, como se sentissem donos da empresa, na visão de Lucas Madalosso, que traz a experiência de ter implantado o Scrum e o Daily tanto na Terraz Aluguel Digital, de Florianópolis, da qual foi CEO, quanto na startup Refera, plataforma de gestão para imobiliárias que comanda atualmente.

Madalosso propõe inclusive que o Daily seja a primeira medida implantada por uma empresa que pretenda adotar metodologias ágeis. “A partir daí as pessoas verão o quão transformador é ser disciplinado, e naturalmente isso é replicado a todos os setores”, diz, ao comentar os efeitos dessa rotina sobre a imobiliária que dirigiu. Sobre a manutenção da prática em tempos de pandemia, ele defende que as reuniões virtuais não perdem sua função e sua vitalidade – sugere apenas que todos estejam com as câmeras ligadas. “E que sejam feitas em momentos de menor demanda cotidiana, como no começo ou no final da manhã, quando todos estão com a cabeça fresca”.

Reuniões virtuais não perdem sua função e sua vitalidade

Na Terraz, o fracionamento de tarefas em espaços menores de tempo foi implantando tão à risca que a própria bonificação passou a considerar o cumprimento das metas diárias. Claro que isso demandou um controle mais rígido, mas os resultados, aponta Madalosso, foram visíveis a partir dessa implementação.

Agilidade não é pressa

As reuniões diárias têm ainda a capacidade de reforçar o comprometimento da equipe, individual e coletivamente. “Se você começa a identificar as demandas diárias, todo o time corre atrás para resolver o problema. São acordos de trabalho”, diz Ricardo Bruno Alves da Silva, instrutor certificado de Método Ágil que participou do projeto de transformação digital da imobiliária Lopes.

Ricardo Bruno faz também uma ressalva fundamental para uma empresa que pretenda implantar o Daily: evitar que o ganho de tempo se transforme imediatamente em mero acúmulo de tarefas, gerando sobrecarga na equipe e insatisfação. É a chave para que a agilidade, e não a pressa, se torne definitivamente parte da cultura da empresa. 

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