Está chegando ao fim a era dos portais imobiliários?
Resumo
Qual o futuro dos portais imobiliários? É a pergunta que mais ouvimos nos últimos dias, após a crise de relações públicas do ZAP Imóveis. Ouvimos profissionais do mercado imobiliário de várias regiões do país que compartilham conosco a sua opinião sobre o assunto.
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Na última semana, o mercado imobiliário viu uma crise de relações públicas bem de perto. Uma página do ZAP Imóveis (que já foi tirada do ar) trazia uma calculadora que sugeria que 6% do valor do negócio, comissão paga para os corretores, poderia ser “economizada” pelo proprietário ao anunciar diretamente no portal. Apesar de fontes afirmarem que essa página já estava no ar fazia algum tempo, o print foi rolar nos grupos de WhatsApp no setor bem no dia 15 de setembro, conhecido como “dia do cliente”. A combinação de fatores fez o tema explodir e o mercado se questionar: qual o futuro dos portais imobiliários?
Antes, um histórico
Antes de se propor a responder essa pergunta, vale lembrar de outros fatores que levaram à reação tão significativa do mercado. Não é de hoje que imobiliárias reclamam da falta de qualidade de leads que os portais estão gerando, que até trazem volume, mas nem sempre qualidade. No último ano, a aquisição do Grupo ZAP pela OLX Brasil intensificou o estranhamento nessa relação.
Marcielly Borges, que comanda a franquia da REMAX em Cuiabá (MT), conta que, na mesma semana que explodiu o print da desintermediação, recebeu uma comunicação avisando que os planos do Grupo ZAP agora devem incluir o pacote da OLX. “Sempre gostei muito do VivaReal, indicava para colegas e estava satisfeita com a qualidade do portal. Há alguns anos, quando houve a fusão com o ZAP, os assinantes foram surpreendidos com os preços que triplicaram por conta da ‘super vantagem’ de ter o ZAP no pacote. Não existia escolha sobre aderir ou não. Eu e vários colegas ficamos incomodados com tal postura, mas optamos por negociar e continuar. Mas agora a história se repete com OLX: ou adere, ou cancela”.
A recepção de imobiliárias e corretores
Um dos sentimentos entre atores do mercado foi naquela linha dos memes: desapontado, mas não surpreso. “Na minha opinião, o ZAP só age com interesses financeiros, infelizmente. Eles poderiam (e têm força para isso) tentar resolver de uma vez por todas o maior problema do mercado imobiliário brasileiro, que é a falta de um MLS e os anúncios duplicados. Só que o ZAP lucra fortunas com anúncios duplicados – o que é péssimo para imobiliárias e clientes”, analisa Gustavo Junqueira, da Imobiliária Junqueira, de Piracicaba (SP).
Muitos passaram a revisar as relações e parcerias formadas no mercado. “Uma das lições que deve ficar dessa situação é que as marcas que não respeitam seus principais clientes não têm vez, assim como os portais não respeitaram os corretores”, opina Marcielly.
Houve os que ficaram pessoalmente ofendidos pela publicação e se movimentaram nas redes sociais da marca – que optou por, primeiramente, ocultar todas as publicações. Quando essa reportagem foi redigida, três publicações já estavam disponíveis novamente, todas com comentários de corretores e corretoras.
“Recebi com muita decepção. É uma falta de respeito, parceria e até de humanidade. Digo isso pois são pais de família que estão trabalhando para levar seu sustento para casa, ninguém está brincando de corretor de imóveis. Temos custos altíssimos para manter nossa profissão, pagamos conselhos, anúncios, vestimenta, transporte para que a gente consiga se manter nessa profissão. Ver um portal conhecido, forte e abrangente [fazendo isso] nos faz refletir que tipo de parceria estamos fazendo”, comenta Alan Rocha, sócio diretor da Rocha Andrade, de Salvador (BA).
Para Marco Antonio Uliano, diretor da Coliseu Imóveis, de Concórdia (SC), é o momento das associações se manifestarem para evitar um futuro desintermediado. “Penso que a questão não é o anúncio em si. Pedir desculpas e prometer que não vai mais fazer o anúncio não é o ponto nevrálgico da situação, mas sim a intenção deles. O que aconteceu, já foi. Independente de fazer isso publicamente ou por baixo dos panos, o problema é que a intenção é começar a desintermediar. A questão é: esses portais e grupos têm grandes bancos de dados. Os Crecis e Cofeci precisam buscar uma lei, uma regulação para que toda transação imobiliária seja acompanhada por um corretor”, opina.
Importante é evitar colocar todos seus ovos em uma só cesta
Nas últimas semanas, as imobiliárias passaram a ver com outros olhos as novas formas de divulgação de seus imóveis. Felipi Adauto, diretor executivo da DF Casa Imóveis, de São Paulo (SP), faz um paralelo com relações do próprio mercado imobiliário, sobre a importância de se investir na casa própria. Ou seja, no próprio site. “Fica o alerta de que as imobiliárias precisam, de fato, ter a consciência de entender que seu trabalho precisa ser direcionado para sua casa própria, o seu site. E não pensar em alugar o terreno – que são esses classificados. Quando a imobiliária pensa somente em fazer anúncio em portal, ela está pagando aluguel. A visão da imobiliária e do corretor de imóveis precisa ser voltada de modo primordial para seu próprio terreno, para o seu site. Gerando conteúdo de qualidade para os clientes e pensando, cada vez mais, em trazer o cliente para sua casa”.
“O corretor precisa enxergar isso como um passo natural de empresas de tecnologia que estão voltadas para o consumidor e trabalham com dados. O profissional que ficou atento a esses movimentos e se preparou está trabalhando com nichos, fidelização e serviço agregados. O cliente precisa do corretor para ajudar na jornada, mas faz tempo que ele não precisa do corretor para encontrar o imóvel. A informação agora é commodity. E o excesso de informação faz você procurar o especialista”, analisa Guilherme Carnicelli, cofundador do Café Imobiliário e head de desenvolvimento imobiliário na EEmovel.
Há vida além dos portais?
É possível ter uma imobiliária bem sucedida sem depender unicamente dos anúncios nos portais imobiliários. É o caso da Refúgios Urbanos, de São Paulo (SP). A empresa nunca fez uso de portais e sempre apostou em outras estratégias para geração de leads.
“Quando a Refúgios nasceu, inicialmente não anunciamos em portais por questões financeiras, mesmo. Estávamos construindo a marca e tivemos que optar onde colocar nosso dinheiro: em anúncios nos portais ou na nossa marca, mesmo sabendo que demandaria um trabalho mais orgânico, menos imediato. Mas, com o tempo, essa estratégia se mostrou proveitosa e percebi que investir na nossa marca gera uma sinergia maior com nossos clientes. No fim, isso se tornou uma escolha: por que investir em uma plataforma externa quando podemos investir na nossa própria plataforma?”, conta Matteo Gavazzi, sócio-fundador da empresa.
No caso da Refúgios, a imobiliária trabalha com um investimento forte na sua própria marca e seus próprios canais. “Hoje, temos uma presença forte no Instagram, estamos presentes no Facebook, temos uma estratégia de LinkedIn, YouTube e Google Ads. Mas tudo isso vem como uma maneira de guiar as pessoas e levá-las ao nosso site, que tem todos os nossos imóveis. Com essas plataformas, conseguimos criar estratégias, saber para onde vai nosso dinheiro e ter uma abordagem mais como um sniper do que atirar para todo o lado. Não é o caso de tirar os anúncios de tal portal ou canal imediatamente, mas sim de ter um olhar crítico sobre onde vai seu investimento na estratégia de geração de lead”, compara Matteo.
O exercício de desenvolver a sua marca vai além da relação com portais ou redes sociais. Na verdade, é uma questão de autonomia de marca. “Pessoalmente, acredito que todos deveriam investir uma parte da sua rotina no desenvolvimento e evolução da sua própria marca – seja com mais ou menos velocidade. Aqui, já tivemos que rever nosso posicionamento, tirar um pouco dos anúncios do Instagram, investir no Google Ads, explorar tal rede social… Pois não é legal ficar dependente de nenhuma plataforma que pode mudar as regras do jogo a qualquer momento. Quanto mais você fortalece sua marca e o seu site, mais terá um negócio protegido e menos sujeito a esses problemas que podem surgir”, conclui.
Mas afinal, está chegando ao fim a era dos portais imobiliários?
É difícil responder essa pergunta, uma vez que depende de uma série de fatores e não há resposta única. É importante lembrar que o mercado imobiliário é pulverizado, tem dinâmicas próprias e, inclusive, locais. Há regiões em que os usuários fazem mais uso dos portais, mas também há nichos que usam menos, por exemplo.
De toda a situação que rolou (e ainda está rolando), fica uma grande reflexão para os dois lados: é muito importante conhecer sua marca, seus objetivos a longo prazo e ter clareza de seus valores.
Tudo certo! Continue acompanhando os nossos conteúdos.
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