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A cidade para pessoas: uma conversa com Benedito Abbud
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A cidade para pessoas: uma conversa com Benedito Abbud

15 jul 2020
Última atualização: 25 julho 2024
Ana Clara Tonocchi
Ana Clara Tonocchi
4 min
A cidade para pessoas: uma conversa com Benedito Abbud

Nos últimos meses, discute-se muito as tendências para o futuro da moradia e das cidades. E agora, parece que o mundo foi dividido em um novo a.C / d.C: Antes do Coronavírus e (o tão esperado) Depois do Coronavírus. Observando a movimentação de retomada da conexão com a natureza, buscamos um paisagista e arquiteto que está muito envolvido com este universo, Benedito Abbud. Com mais de 40 anos de experiência, para Abbud, paisagismo é sinônimo de qualidade de vida – que todos estamos buscando.

Em uma conversa (virtual, que vocês vão perceber ser a mais nova modalidade preferida de reunião do paisagista), Abbud levantou três mudanças na dinâmica das cidades. Em comum, estão as mudanças nos deslocamentos e nas relações com os espaços urbanos. 

Confira a seguir.


Ascensão das reuniões remotas

Até o início da pandemia do coronavírus, quando recomendou-se o isolamento social, muito do nosso tempo era perdido no trânsito. Em uma cidade como São Paulo, por exemplo, quando se tinha uma reunião marcada, era preciso considerar uma hora para ir, o tempo de reunião, mais uma hora, às vezes uma hora e meia para voltar para o escritório. “Com a quarentena, o que mudou não foi a tecnologia. Nós já tínhamos, já estava disponível. O que mudou foi o costume das pessoas, o hábito. Estamos vendo as vantagens de fazer várias coisas virtualmente”, comenta Abbud.

Quando diminui-se o tempo de deslocamento, aumentou, inclusive, o número de reuniões por dia. “Claro, pessoalmente é mais gostoso, você conversa, toma um cafezinho. Mas agora as pessoas estão vendo que as reuniões remotas são muito mais efetivas. Antes, eu conseguia fazer uma, duas por período. Agora faço três ou quatro”.

Além disso, diminuem os deslocamentos que são ainda mais longos, como é o caso de projetos em outras cidades e até mesmo outros países. “Eu pegava muito avião e não sinto nenhuma saudade de estar em um aeroporto. Com as reuniões virtuais, aumentamos a efetividade das reuniões em si e das relações interpessoais, permitindo que a gente estreite relações com pessoas do mundo todo”.


Chegada dos carros autônomos

As cidades estavam lotadas, e ainda mais lotadas de carros. Chegamos em um momento que as avenidas não comportavam mais, congestionamento acumulado e o transporte público não dava mais conta. E então, há alguns anos chegou o Uber. Abbud analisa que a chegada destes aplicativos de transporte por si só já impactou diretamente o mercado imobiliário. 

“O Vila Nova Conceição, por exemplo, é um bairro antigo de São Paulo que passou por um momento de desvalorização porque os imóveis tinham poucas vagas de garagem. Tinham entre uma ou duas por apartamento, enquanto o público com poder aquisitivo para a região queria imóveis com quatro ou cinco vagas. Com a chegada dos aplicativos de transporte, a região está se revalorizando”, conta.

Para ele, agora, a segunda onda de revolução nas cidades com os aplicativos de transporte é com a chegada de carros autodirigíveis, que não precisam de motorista e usam inteligência de dados para se movimentar na cidade. “Imagino que em cinco anos, quando estes carros automatizados estiverem na rua, o trânsito vai ser melhor distribuído, de forma mais inteligente. Usando dados de trânsito e sem se limitar por orientações de rua, por exemplo”.


A cidade para pessoas

Um movimento que engloba as duas tendências anteriores é a visão da cidade para as pessoas. “Até então, nosso urbanismo vêm sendo muito pautado no carro, no veículo. É um modelo americano, fica até difícil para as pessoas atravessarem a rua. Este modelo de cidade é agressivo por não ser pensado na vivência das pessoas. Não tem aquele cantinho perto da sua casa, aquela pracinha para relaxar”, explica o paisagista.

Hoje, vivemos em uma cidade de multidões solitárias: pessoas sozinhas no meio de multidões de gente. Então, para Abbud, há esse grande direcionamento de tendências, e não só um modismo, de devolver a cidade para seus habitantes. Organizá-las para quem, realmente, as vive. “Grandes bairros novos do mundo inteiro têm como eixo, como foco, os parques, os pátios, a arborização. E essa febre não se restringe há espaços verdes, inclui elementos como a largura das calçadas”, aponta.

Abbud explica que a periferia e bairros mais populares são muitas vezes concebidos como “depósitos de gente”. “Não é uma cidade, não há lazer, não há verde, não há espaços de descompressão. Vemos crianças brincando em corredores, sai correndo, chega na porta e não tem a calçada para proteger do carro a 80/h. O centro do bairro vira o bar da esquina. Os adultos, os jovens, até as crianças frequentam. O futebol de várzea tá morrendo, você não tem mais espaço, não deixaram mais espaço. O que resulta em vários problemas sociais, depressão e, inclusive, a dificuldade de praticar o isolamento social”.

Neste movimento de devolver a cidade para seus habitantes, acompanhado do fim do isolamento social, devemos observar o reuso dos espaços públicos. “As pessoas vão continuar morando em imóveis menores, mas precisam ter acesso a praças, parques e inclusive com internet livre nesses locais. Assim, poderão trabalhar de qualquer lugar da cidade”, conclui.

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