Saúde mental no mercado imobiliário: como lidar com estresse, ansiedade e burnout em um ambiente opressor?
Resumo
Carolina Brum, gerente de gestão de pessoas da Imobiliária Casarão, dá dicas para lidar com saúde mental no mercado imobiliário.
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Gestão de pessoas, estresse, ansiedade e síndrome de burnout são exemplos de expressões que vieram para o centro das conversas corporativas nos últimos dois anos. E a saúde mental no mercado imobiliário também foi bastante discutida desde o início da pandemia, com o acréscimo de algumas particularidades.
No segmento da locação, a alta desenfreada do IGP-M sobrecarregou as imobiliárias, que repentinamente se viram obrigadas a mediar seguidos conflitos entre proprietários e inquilinos pelo reajuste do aluguel. A inadimplência cresceu, ainda que de forma leve, bem como as desocupações de imóveis.
Por causa da pandemia, imobiliárias que ainda tinham processos presenciais e manuais foram empurradas à digitalização, sendo obrigadas a aprender novas ferramentas e rever suas práticas em meio às incertezas no início da epidemia do coronavírus.
E as equipes internas enfrentaram essas mudanças ao mesmo tempo em que se acostumavam às novas dinâmicas do trabalho remoto – que, além das dificuldades intrínsecas, retirou a proximidade física com os colegas como oportunidade de válvula de escape aos dilemas profissionais.
Isso sem contar o luto de quem perdeu um ente querido para a Covid-19.
Diante desse quadro desafiador, equipes de gestão de pessoas e RH humanizado ganharam mais relevância e protagonismo da pandemia para cá dentro do segmento. Não à toa, a administração de conflitos na imobiliária foi o tema mais sugerido pelos participantes inscritos na rodada de negócios com gestores de locação do ICXP 2022, evento presencial do mercado imobiliário promovido pela CUPOLA e pelo Imobi Report em março, em Curitiba.
No ICXP, uma das palestras mais concorridas foi da gerente de gestão de pessoas da Imobiliária Casarão, de Pelotas (RS), Carolina Brum, que falou justamente sobre a síndrome de burnout e a ansiedade dentro das equipes no imobiliário.
Para ela, estar engajado é ter um vínculo positivo com o ofício, e até o estresse pode trazer benefícios. O problema está na dosimetria. “O burnout é a falta de pausa no estresse, é não aceitar descansar. Ele surge em ambientes com grande pressão e nenhuma pausa, onde tudo é importante e para ontem”, diz Carolina, que conversou sobre o tema com o Imobi Report minutos depois de palestrar no ICXP. Confira:
Imobi Report: A atividade de intermediação da locação envolve a mediação de conflitos: de um lado está o patrimônio e de outro a moradia, temas muito sensíveis às pessoas. Essa é uma das origens do estresse das equipes de atendimento nas imobiliárias? O que fazer para minimizar essa tensão?
Carolina Brum: Com certeza, contribui. É difícil dizer qual é a origem, as causas exatas. A síndrome de burnout, esse estresse agudo, que permanece, está diretamente relacionado ao ambiente de trabalho. É importante compreender que o estresse pode sim acontecer, e inclusive ser um fator positivo. O estresse tem um viés de nos tirar da letargia, de nos provocar a ação. Então, precisamos observar as relações, gerir conflitos, saber como apoiar nossos times e saber quais instrumentos podemos fornecer para que as equipes consigam lidar com o seu estresse, com os seus sentimentos.
Imobi: Afastamentos por estresse no trabalho são relativamente corriqueiros, mas nunca se falou tanto sobre saúde mental no ambiente corporativo. Para você, isso decorre de a sociedade estar prestando mais atenção ao tema, ou na verdade a razão é o próprio aumento de situações de estresse nas empresas?
Carolina: Isso se relaciona com a maneira como a nossa sociedade se liga ao trabalho. A sociedade moderna é a sociedade do cansaço, do desempenho, que acha que não pode parar. E isso faz com que esse estresse constante gere situações de adoecimento como a síndrome do esgotamento profissional.
Então, tivemos um contexto de pandemia, em que equipes que nunca tinham ido para o trabalho remoto precisaram encarar essa modalidade ou o trabalho híbrido, e isso colabora com o quadro. Mas, é algo maior que nós, é sobre a forma como a nossa sociedade está se relacionando com os ambientes de trabalho.
Imobi: Que sinais um gestor deve perceber em sua equipe para que uma sobrecarga de trabalho, o que às vezes é normal, não se transforme em crise de ansiedade ou até num burnout?
Carolina: Meu papel como gestora de pessoas é apoiar o desenvolvimento dos líderes, porque é insustentável que o RH sozinho cuide da pauta de saúde mental e acompanhe todo o time. É um acompanhamento que precisa ser ininterrupto. Nós atuamos para desenvolver as nossas lideranças para que tenham conversas individuais, colham feedbacks, com um olhar criterioso e profissional: “O pessoal está tirando férias?”; “As reuniões sendo produtivas ou só as mesmas pessoas que falam?”; “Como estou abrindo os espaços de conversa e os espaços de escuta?”
E as lideranças também devem estar fortes, pois elas próprias são vítimas muito frequentes do burnout, para poderem apoiar o time e identificar casos nos quais a gente tenha que intervir de uma forma mais presente.
Imobi: O que a pandemia ensinou quanto ao home office no campo da gestão de pessoas? Como manter os times produtivos e a integração social no caso de trabalho remoto?
Carolina: Essa pergunta é desafiadora porque ela passa por uma transformação cultural. A partir do momento em que a pessoa não está ao alcance dos meus olhos, eu não tenho como mensurar. Então essa pergunta é sobre cultura porque ela passa por processos. Quais são os processos, os indicadores que me dizem que aquela pessoa está contribuindo com seu trabalho? Então, não é só entender e atuar sobre as pessoas, mas também articular tecnologia, pessoas e processos, para então conseguir ter essa clareza sobre o que o time está entregando.
E sobre a integração quando estão em casa, a gente durante a pandemia teve o time remoto 100%, teve o time híbrido e agora estamos novamente com o pessoal no presencial. Nós propusemos diversas atividades, inclusive o nosso programa de Comunicação Não-Violenta foi feito à distância, utilizando ferramentas de facilitação. É possível, mas os espaços de conversas, os espaços de reflexão e de escuta precisam ser ainda mais frequentes quando o pessoal está no remoto.
Imobi: Muitas vezes, donos e gestores de imobiliárias não percebem que o cuidado com as pessoas interfere diretamente inclusive no resultado financeiro das empresas. Como você vê o teu trabalho refletindo diretamente na saúde financeira da Casarão?
Carolina: Eu acredito no RH estratégico, e a minha equipe atua dessa forma. É aquele RH que compreende o negócio. Então, as minhas conversas com o João [Pedro Neves], CEO da Casarão, são sobre negócios, sobre o comercial. E, a partir dos produtos de gente, a partir das pessoas, como eu colaboro para que a Casarão alcance os objetivos estratégicos?
Eu falo que a gente precisa equilibrar as três saúdes, a física, a mental e a saúde financeira da empresa. Essa é uma contribuição muito positiva do RH. E há muitas pesquisas mostrando que o desempenho, a performance, a produtividade que a gente quer não estão em uma cultura de agressividade, de desconfiança, e sim nos ambientes positivos, que geram pertencimento, orgulho, engajamento. Estão nesse comprometimento afetivo, ao contrário do que muitas vezes a gente pode imaginar, que é algo calculativo. Não, o afetivo também gera resultado.
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