5 lições que o BR pode aprender com o mercado imobiliário norte-americano
Resumo
Conheça algumas tendências do mercado imobiliário norte-americano que podem ajudar a entender o futuro do mercado brasileiro.
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Um bom modo de reunir referências e construir repertórios é olhando para cenários e mercados de fora do país. É preciso sair da ilha para ver a ilha. E o mercado imobiliário norte-americano, salvo suas particularidades culturais, pode ser uma boa referência para quem atua no mercado brasileiro.
Por que olhar para o mercado imobiliário norte-americano?
Antes de entrar no setor do imobiliário, há alguns fatores que nos aproximam dos Estados Unidos. Somos grandes países em termos geográficos e, de forma geral, a cultura pop brasileira absorve e reage muito bem à cultura pop americana.
Mas voltando para o mercado imobiliário, os EUA estão alguns passos à nossa frente e podemos tirar algumas lições de lá, para aplicá-las aqui. Por exemplo, a atuação de portais e startups está mais consolidada em terras americanas. As startups, lá, já ingressaram na bolsa de valores, como a Compass na última semana.
Há outras diferenças significativas: legislativas, adoção de tecnologias, educação corporativa e, claro, de valor de mercado. Então, o Imobi traz 5 lições que podemos aprender com o mercado imobiliário norte-americano:
1. O MLS e a organização dos dados
O american dream do mercado imobiliário brasileiro tem nome: MLS. Sigla para multiple listing service, é uma organização de todos os anúncios de compra e venda de imóveis em um serviço organizado pelo NAR, a Associação Nacional dos Corretores dos Estados Unidos. Cada estado tem seu próprio MLS, que consiste em informações públicas sobre aquele imóvel: quando foi construído, por quem, quem comprou, quem vendeu, por quanto. Para Guilherme Blumer, diretor de marketing e transformação digital na Brasil Brokers, o jogo acaba sendo mais justo nos EUA. “Lá, você tem o histórico do empreendimento, você sabe o que aconteceu, quando. Isso faz com que a imobiliária e o corretor precisem prestar o melhor serviço. Se resume a como você resolve o problema do cara com a menor fricção possível”, aponta.
“A consequência do MLS é que o acesso a dados e informação de muita qualidade é muito mais fácil. Isso representa um benefício para o consumidor, que encontra mais informações confiáveis, mas também representa uma oportunidade para empresas que organizem essas informações e usem como recurso para o consumidor final”, analisa Brian Requarth, fundador do VivaReal e investidor de proptechs.
Como é segmentado por estado, em Nova York, os profissionais locais decidiram não aderir ao MLS. “É importante entender que no mercado mais pujante, onde você tem uma oferta e demanda em que a valoração flutua justamente pela localização, a indústria imobiliária não quis estabelecer o MLS. Lá, o imobiliário é tão quente que NY é um mundo à parte. Isso porque no mercado aberto, quem tem a melhor proposta de valor se destaca”, comenta Ernani Assis, managing director da eXp Brasil.
No Brasil, estabelecer um MLS é um processo complicado. Isso pois, hoje, temos majoritariamente dois tipos de dados disponíveis: os dados das ofertas nos portais, que normalmente são avaliados um pouco mais alto para dar espaço para negociação, e os dados dos registros em cartório, que podem ser mais baixos devido à prática sistêmica de sonegação de impostos, característica da sociedade brasileira. Então, para o desenvolvimento de um MLS brazuca, precisaríamos de um engajamento dos atores envolvidos, das entidades representativas do setor e, inclusive, do consumidor final.
Mas já que o MLS parece um cenário distante, porque estamos falando disso? Pois é um grande exemplo de organização de dados. “No geral, os Estados Unidos é um país extremamente estruturado do ponto de vista da organização da informação. E essas informações são usadas de maneira estratégica. Você tem a transparência no patrimônio das pessoas e o histórico do imóvel em um clique”, analisa Ernani.
Aqui no Imobi, já falamos sobre cultura data driven e o assunto volta à tona. É importante que os negócios organizem seus dados para serem mais assertivos nas suas atuações, negociações e análises de mercado.
2. Em países de proporções continentais, é importante entender as diferenças de região para região
Assim como somos um país muito grande, os Estados Unidos também é. Lá, os estados são legalmente mais autônomos e podem legislar dentro da sua região. Sem entrar em detalhes de política interna, o mercado imobiliário também acaba seguindo a ordem de legislação local, como é o caso do MLS e o fato de Nova York não aderir ao seu uso.
Deste aspecto, podemos entender a importância de respeitar as diferenças entre cada região. É importante lembrar que o mercado do Norte brasileiro é diferente do mercado do Sul, que é diferente do mercado imobiliário do Centro do país. Cada região tem seus costumes e os clientes locais gostam do atendimento de certa maneira ou tem predileção por certos tipos de imóveis, por exemplo.
Assim, para uma empresa entrar e atuar em regiões diferentes, é preciso conhecê-la, estudá-la e, se possível, fechar parcerias com atores locais.
3. A importância da educação executiva
Falando em estudos, este é tópico relevante na análise do mercado imobiliário norte-americano. “A relação entre imobiliárias e corretores é um pouco diferente nos EUA pois para ser um corretor você precisa ter uma licença que está conectada a uma imobiliária. No Brasil, você só precisa do Creci, não precisa, necessariamente, trabalhar dentro de uma imobiliária”, explica Brian.
Como consequência disso, um dos pontos de educação no mercado imobiliário está diretamente ligado com a cultura de educação executiva nos Estados Unidos. “De forma geral, lá as empresas promovem mais treinamentos para seus colaboradores. O nível de profissionalismo acaba sendo um pouco mais alto, se estuda mais e os profissionais são mais capacitados”, aponta Brian.
No mercado brasileiro, imobiliárias americanas que vieram para cá continuam apostando na educação executiva, como é o caso da RE/MAX, que inclusive tem a RE/MAX University. Também a eXp, que chegou no Brasil neste ano e tem como uma das fundações o treinamento de corretores. Para Ernani, esta educação deve ser promovida a largos passos e, principalmente, ser propagada de cima para baixo. “O desafio maior do nosso mercado não é educar só os corretores, mas é educar o dono da imobiliária. Eles são os multiplicadores”, afirma.
Mas claro que essa educação pode ser buscada individualmente. “A aprendizagem contínua é um investimento pessoal que o corretor deve fazer para sua carreira. Esse entendimento faz com que todo o ecossistema se profissionalize de um jeito diferente”, analisa Brian.
4. Branding e a evolução: de commodity a serviço
A busca por conhecimento está diretamente relacionada à noção do corretor norte-americano do seu papel na jornada de compra do consumidor. Além da marca da imobiliária, é o investimento de cada corretor na sua persona. “O corretor americano sacou que o business do nosso mercado é a pessoa, é a dor do cara. Um estudo nos EUA mostra que os melhores agents do país colocam dinheiro próprio na sua marca. Destes, 40% vão para gerar lead e 60% em gerar awareness. Ou seja, divulgar seu nome, fazer seus brindes, anúncios”, conta Blumer.
Para Blumer, exemplo de investimento na sua marca é o corretor Ryan Serhant, que atua em Nova York. Serhant começou a atuar no mercado imobiliário em 2008 (em plena crise, diga-se de passagem) e logo foi promovido a vice-presidente na imobiliária que trabalhava. Em 2012 lançou seu próprio time de corretores e, em 2020, sua própria imobiliária. Serhant é conhecido por estratégias criativas para fechar negócios: já contratou uma banda marcial para demonstrar a eficácia de janelas com isolamento acústico em um apartamento. Hoje, o corretor participa de dois reality shows na TV norte-americana.
“Serhant é o claro corretor que vira popstar. Colocar seu imóvel listado com tal corretor é quase status social: coloquei na Serhant. Eu brinco que é uma applenização das coisas. É tanto valor agregado que o consumidor não liga para pagar mais pelo produto ou serviço”, analisa Blumer.
O que nos leva a outra observação importante: a evolução do nosso mercado de um mercado de commodity para mercado de serviço. “O pulo do gato é entender que estamos atuando em um business de serviço, para resolver a dor do nosso consumidor. Agora, a briga é por quem oferece o melhor serviço do processo de compra de um imóvel. E quem vai ganhar é quem entregar a melhor jornada”, aponta Blumer. “Aqui, ainda vejo uma postura de: tô vendendo commodity, vou no portal e vou competir com 5 anúncios iguais. O concorrente usa a tua foto, chega a este nível de bizarro. Nos Estados Unidos, não só eles entenderam que o serviço é a nova entrega como entenderam que assim podem monetizar outros tipos de serviço na jornada, não só o valor do imóvel”, continua.
5. Exclusividade, curadoria e a dependência dos portais
Há quem diga que os portais são a evolução dos anúncios de jornal para a telinha do computador. “Do ponto de vista básico, um portal constrói um efeito de rede, como o Facebook ou até a Amazon. Ou seja, para você ter mais compradores, você precisa de volume, mostrar mais coisas, ter mais anúncios e lá no final, na ponta, o consumidor final é o grande beneficiário desse processo. E como esses business fazem isso? Awareness, branding, propaganda, chamando a atenção das pessoas. Esse é um business de atenção, criando valor para a marca”, afirma Blumer.
Ou seja, o anúncio em grandes portais pode ser estratégico para muitas imobiliárias, mas os grandes players norte-americanos já entenderam que, para bater de frente com portais, um dos caminhos pode ser o de anúncios exclusivos. “A primeira imobiliária americana que lembro de ter essa estratégia é a Howard Hanna. Eles tinham listagens exclusivas: tipo de imóveis que não têm anúncio em portais, só no próprio site. A Compass também faz isso. 18% dos anúncios são exclusivos, dentro da própria Compass. Mas tem regiões em que a porcentagem é maior: em São Francisco, por exemplo, chega-se a ter 70% dos anúncios exclusivos”, conta Blumer.
Isso exige um trabalho de diferenciação e curadoria de imóveis. Uma das soluções é apostar em um nicho: seja de bairro, perfil de consumidor ou tipo de imóveis.
O alto padrão é um exemplo. “No Inman de fevereiro do ano passado, teve uma discussão bastante interessante. Era uma discussão sobre a eficiência do Zillow em trazer lead de qualidade (avalie que o papo é igual com os portais daqui) para pessoas de altíssimo padrão que querem compra de casas no Hamptons, por exemplo. E não existe esse nicho em abundância no Zillow. E aqui idem. Se você ver os dados do ZAP, mais de 80% do tráfego são de imóveis até 450 mil reais. Então se você não trabalha com essa faixa de renda, você tem problemas e tem que atuar com outras estratégias”, analisa.
Bônus: é possível a existência de um Zillow brasileiro?
Para Brian, essa pergunta é uma falácia. “É comum que a gente queira pensar quem será o próximo Zillow, já que Zillow é uma empresa consolidada, que vale muito dinheiro e domina o mercado. Mas o mercado brasileiro precisa procurar soluções pontuais para seu mercado, que resolva problemas locais”, aponta.
Mas a ascensão de novos players que promovem uma jornada mais simples e com menos fricções deve acender uma luz amarela para grandes imobiliárias. “Lembro nos EUA quando a internet cresceu muito, há 20, 15 anos e a preocupação do mercado era que os portais matassem o corretor. Não aconteceu, de fato até fortaleceu mais o papel do corretor. No Brasil, o cenário é parecido. Quem vai ter mais dificuldades, na minha opinião, serão as imobiliárias grandes, pois hoje, se você olhar as grandes imobiliárias brasileiras, são gerentes gerenciando gerentes. No final das contas, o corretor ganha muito pouco. O que está acontecendo no Brasil é que quem vai se beneficiar mais com o crescimento dos portais será o corretor. Seu papel continua importante e os bons profissionais têm espaço. Os portais não vêm para tirar os corretores, isso faz as pessoas se apavorarem, mas não acho que seja o foco dos portais atuais. O mercado de real estate tem suas particularidades e não permite um monopólio, então não vejo um cenário como o Google que monopoliza a busca e acaba por dominar o mercado”, analisa o investidor.
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