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“Eu gosto de pagar impostos, com eles eu adquiro civilização”

Ao propor o Projeto de Lei 709/2022 o Senador Alexandre Silveira, de Minas Gerais, retomou com felicidade e oportunidade um reclamo bastante antigo, o dos inquilinos que entendiam justo abater os aluguéis despendidos, para a apuração do imposto de renda a pagar.

As principais bases da pretensão dos locatários de imóveis residenciais eram duas: (1ª) a isonomia diante das “pessoas jurídicas”, que (ao contrário das pessoas físicas) abatiam os aluguéis pagos quando apuravam seus lucros que sujeitariam à tributação; (2ª) ser inescapável, de certo modo, arcar com essa despesa para residir, o que a assemelharia a algumas outras, como os gastos com educação, por exemplo, que podiam ser abatidas.

O primeiro dos argumentos para o abate dos aluguéis na apuração da renda anda, diga-se, na estrada trilhada por vários economistas que repensam todo o sistema tributário mundial, reforçando o capitalismo e beneficiando pessoas e progresso (se puder, leia as mais de 600 páginas de O Capital do século 21, do economista francês Thomas Piketty, na tradução da também economista Mônica de Bolle).

Mas o PL 709 fez mais que atender aos locatários residenciais, a eles permitindo a dedução dos valores pagos (pelo declarante e pelos seus dependentes) a título de locação do imóvel de sua efetiva residência, no cálculo da renda a tributar. Convém observar que o dispositivo legal que o Projeto pretende alterar é o artigo 8º da Lei nº 9.250/1995, que trata das deduções para cálculo da base do imposto devido, e os aluguéis passariam a acompanhar a situação das despesas com médicos, hospitais etc., situações já tradicionais. Isso sugere a perenidade da nova medida.

Realmente, com essa dedução do imposto de renda, a lei trará para a legalidade uma desconhecida quantidade (malgrado estimável – afinal se sabe que as pessoas moram e se sabe com razoável margem de acerto quantos não são proprietários nem comodatários de suas residências), um sem número de locações que findam realizadas à margem da formalidade, com isso perdendo benefícios legais e, sim, dando ensanchas à sonegação fiscal. E o desrespeito à formalização sairá caro, pois foi prevista a duplicação da multa nos casos em que o contribuinte prestar declaração inexata, deixar de informar ou informar com inexatidão os valores recebidos a título de locação residencial de bem imóvel. Sim, sonegar será perigoso.

Especificamente na locação para moradia, a singela possibilidade de dedução dos valores pagos no momento da declaração à Receita Federal obrigará à atenção à legislação locatícia que, isso é sabido, teve por meta essencial, nos idos de 1991, atender a demanda de residências para locação. As pessoas terão maior segurança jurídica. Morarão melhor, estando sob a regência da lei elas gozarão dos benefícios legais (tais como a responsabilidade pelo imóvel e sua manutenção; a regulação das garantias; os períodos de locação e as suas consequências etc.).

Um período de transição e de estímulo foi previsto, quando o Projeto inseriu no artigo 6º da Lei nº 7.713/1988 (que estabelece quais são os rendimentos percebido por pessoas físicas que são isentos), a previsão de que será isenta desse tributo, até o exercício de 2028 (ano-calendário de 2027), a parcela correspondente a 75% (setenta e cinco por cento) dos rendimentos de pessoas físicas recebidos a título de locação residencial de imóveis. Para percebermos melhor a organização da lei, essa previsão de isenção foi colocada no mesmo artigo legal que cuida, por exemplo, da isenção das indenizações por acidentes de trabalho; dos seguros recebidos; dos rendimentos provenientes de aposentadoria e pensão; do valor dos bens adquiridos por doação ou herança; dos valores decorrentes de aumento de capital. Aí está, penso, um senão no Projeto, pois ao limitar a isenção a somente cinco anos, dará prazo evidentemente insuficiente para a pretendida construção de mais residências. O tempo será pouco para tanto que há a ser erigido.

Mais: a clareza e a isonomia (seja entre pessoas físicas e jurídicas locatárias; seja entre locadores de residências que – todos – pagarão os mesmos tributos) permitirão melhor organização de investimentos, sem deslealdades concorrenciais, parecendo válido esperar o desenvolvimento crescente do setor de locação residencial.

Ou seja, estamos diante de uma situação que exemplificaria perfeitamente o acerto da frase (que traduzi livremente para servir de título deste artigo) do norte americano Oliver Wendell Holmes Jr (1841-1935) (juiz da Suprema Corte norte americana): “I like to pay taxes. With them, I buy civilization.”

Tudo indica que a conjugação da possibilidade de dedução pelos locatários com a isenção aos locadores pessoas físicas poderá nos levar a um novo patamar de desenvolvimento e funcionamento das moradias de aluguel.

Jaques Bushatsky

Jaques Bushatsky é advogado, foi Procurador do Estado de São Paulo e Juiz do TIT/SP por dois mandatos e chefiou a Procuradoria da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. Coordenador de Locação e Compartilhamento de Espaços na Comissão de Direito Imobiliário da OAB/SP. No SECOVI – SP (Sindicato da Habitação) é membro do Conselho Jurídico da Presidência, Diretor de Legislação da Locação, Coordenador do PQE e Pró Reitor da Universidade corporativa.

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Jaques Bushatsky

Jaques Bushatsky é advogado, foi Procurador do Estado de São Paulo e Juiz do TIT/SP por dois mandatos e chefiou a Procuradoria da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. Presidente da Comissão de Locação e Compartilhamento de Espaços do IBRADIM – Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário, fundador e diretor da MDDI – Mesa de Debates de Direito Imobiliário. Autor da obra “Aspectos Principais do Aluguel Comercial” e coautor da obra “Locação Ponto a Ponto” publicada pelo IASP Instituto dos Advogados de São Paulo.

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