Presidente do CRECI-SP estima em 80% queda na venda de usados

O Governo Federal, por meio de uma Instrução Normativa (IN) do Ministério das Cidades, formalizou medidas para desestimular o financiamento de imóveis usados. As modificações estão vigentes desde o dia 19/08 e afetam, especificamente, os compradores da faixa 3 do Minha Casa, Minha Vida (MCMV), com renda de até R$ 8 mil. Com as alterações, o valor máximo do imóvel usado que pode ser enquadrado no programa diminuiu de R$ 350 mil para R$ 270 mil. Além disso, o teto da cota de financiamento, que antes chegava a 80%, agora será de 70% para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e de 50% para as regiões Sul e Sudeste. O objetivo da mudança é destinar mais recursos para os imóveis novos, na planta ou em construção, que geram mais empregos. Especialistas consultados pelo Imobi Report afirmam que haverá uma queda radical nas vendas de usados do MCMV. A opinião é compartilhada pelo presidente do CRECI-SP, José Augusto Viana Neto. Ele estima que a diminuição nas vendas de usados abaixo de R$ 350 mil será de 80%. O executivo ainda afirma que as alterações descaracterizam o programa, já que exigir uma entrada de 50% do valor do imóvel não torna a moradia acessível. Ele também pondera que os corretores de imóveis poderão se adaptar e atuar em outros nichos, mas o público de baixa renda ficará desassistido. Confira a entrevista completa a seguir. 1) Qual é sua opinião sobre as recentes mudanças nas regras do MCMV? Minha opinião é extremamente negativa. Essas alterações dificultam que as famílias de baixa renda tenham acesso ao primeiro imóvel. As pessoas querem morar em bairros com fácil acesso para trabalho e escola dos filhos. Com essas medidas, os beneficiários vão perder a liberdade de comprar a casa própria que desejam, nas regiões de sua preferência. Ficarão submetidas às áreas onde os imóveis novos estiverem sendo construídos. 2) De que forma essas medidas descaracterizam o programa? A descaracterização principal é reduzir o valor do imóvel de R$ 350 mil para R$ 270 mil e exigir uma entrada de 50%. O público de baixa renda dificilmente terá um valor de R$ 135 mil para dar de entrada. Trata-se de uma moradia social, deve ser acessível, caso contrário, todas essas pessoas vão ficar impossibilitadas de comprar a primeira casa própria. 3) O governo consultou os CRECIs ou outras instituições antes das mudanças? O Ministério das Cidades não nos consultou. Essas alterações atendem demandas do setor da construção civil. Entretanto, o Brasil ainda tem 7 milhões de desempregados e ninguém quer trabalhar nos canteiros de obra, pois é um emprego pesado e arriscado, que exige qualificação. Eu entendo que o melhor para a habitação é o imóvel pronto. A pessoa paga e ocupa, não tem que esperar dois ou três anos para entrar no apartamento. 4) Os CRECIs estão se mobilizando em torno do assunto? Sim, nós estamos nos organizando com os presidentes dos CRECIs dos outros estados brasileiros. Vamos produzir um documento e já requeremos uma audiência com o presidente Lula. Nós queremos conversar olho no olho, porque o projeto foi totalmente descaracterizado pelo Ministério das Cidades. Acredito que, ao ouvir nossos argumentos, o Presidente da República certamente vai corrigir esse equívoco. De janeiro a junho de 2024, 36% dos recursos do MCMV foram destinados a imóveis usados, é um mercado muito significativo. 5) É possível estimar o prejuízo financeiro para os corretores? Não temos números, mas mantemos diálogo com os profissionais. Sabemos que alguns processos em andamento tiveram que parar. Também tivemos a notícia de negócios que estavam em andamento e foram concluídos sem prejuízo. Certamente, foi um número grande de operações que voltaram à estaca zero, mas ainda é cedo para ter um número preciso. 6) E sobre a queda no número de vendas de imóveis usados, já existe alguma estimativa? A minha opinião é que, quando se trata de imóveis usados abaixo de R$ 350 mil, a queda deverá ser de 80% e 90%. Além das medidas para desestimular o financiamento de imóveis usados pelo MCMV, precisamos lembrar do risco de aumento na taxa de juros. Essa pode ser uma combinação desastrosa para os compradores de imóveis econômicos. 7) Qual é a relevância dos imóveis usados para a carteira dos corretores de imóveis? Para quem trabalha com imóveis usados de até R$ 350 mil, acredito que as perdas serão de 90%. Porém, acredito que o prejuízo maior será da sociedade, porque os corretores podem atuar em outros nichos. O público de baixa renda vai acabar ficando sem a assessoria dos profissionais, que vão prestar seus serviços para os segmentos de médio e alto padrão. E o impacto vai além, a venda de imóveis usados garante a compra de novos. Ninguém compra um carro zero sem antes vender o usado. A mesma lógica funciona no mercado imobiliário. 8) Como os corretores podem lidar com essas alterações? Sugiro investir no networking, para se associar às imobiliárias que estão bem estabelecidas e para ter acesso a clientes com maior poder de compra. Hoje, temos 600 mil corretores em todo o Brasil, isso é a quarta parte do que o país precisa para atender a demanda do mercado. Não vai faltar trabalho, até porque existem muitos nichos de atuação para a venda de imóveis. Os corretores também podem migrar para a locação.

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