metodologias ágeis na incorporação
ConstrutorasDestaques

Uso de metodologias ágeis na incorporação ajuda a aumentar a produtividade, reduzir custos e cumprir prazos

Para quem olha de fora, pode parecer impossível usar metodologias ágeis na incorporação, em especial nos canteiros de obras. Mas as construtoras que apostaram nesse modelo comprovam que o uso de metodologias ágeis na incorporação não só é possível, como também pode trazer inúmeros benefícios para a construção civil, entre eles o aumento de produtividade, redução de custos e cumprimento de prazos. Independente de qual seja o método escolhido, para iniciar a sua implementação, primeiro é preciso conhecer a teoria e identificar quais são as principais dores da empresa. 

metodologias ágeis na incorporação

Também é necessário que a incorporadora esteja aberta a um intenso processo de transformação digital, como pontua Guilherme Quandt, diretor de marketing e estratégia do Sienge. “Quando falamos de incorporação, estamos nos referindo a uma cadeia super extensa, fragmentada e analógica, que para obter um salto expressivo de produtividade e competitividade, precisa de mais previsibilidade e integração entre as diversas áreas envolvidas no processo. E posso dizer com toda a certeza que as metodologias ágeis contribuem muito para isso, pois ajudam a promover a transformação digital do setor e também a dar um pouco mais de clareza no faseamento da obra”, opina. 

A área de tecnologia, por sinal, foi uma das precursoras do uso de metodologias ágeis em seus processos, após seu surgimento na cadeia automotiva, principalmente com o método Lean. Na construção civil, entretanto, as metodologias mais utilizadas têm sido Scrum e Kanban. Para as incorporadoras que estão considerando a possibilidade de utilizar alguma das várias metodologias ágeis em seus processos, Guilherme traz uma dica valiosa. “Primeiro, é preciso criar o que a gente chama aqui dentro de caldo cultural. Depois, à medida que as pessoas vão entendendo que os benefícios são muito maiores do que os esforços, a curva de adoção começa a subir e gerar resultados”, garante. 

Na opinião dele, para que haja essa virada de chave, é preciso que a mudança venha de cima para baixo. “Sem demérito algum para quem está no chão de fábrica – ou no chão de canteiro. Mas esse é o tipo de coisa que precisa vir dos cargos mais altos, pois os gestores precisam ser vetores da transformação cultural, disseminando os conceitos. Depois disso, vem o diagnóstico. Deve-se começar por onde o ponteiro do resultado vai se mover mais rapidamente. Só então, deve-se passar para a ação propriamente dita, com adoção da tecnologia no dia a dia da incorporadora, pelo brutal salto de produtividade observado quando se faz uso da tecnologia para integrar e acelerar os processos”. 

Canteiro de obras também é lugar para metodologias ágeis 

O percurso de implementação das metodologias ágeis citado por Guilherme foi exatamente o caminho adotado pela Dimas Construções. “Quando o setor da construção civil começou a enfrentar dificuldades, uns cinco anos atrás, a gente percebeu que precisava de algum tipo de diferencial para poder se destacar no mercado. Naquele momento, a gente tinha um diretor na empresa bem visionário e ele fez a seguinte provocação: ‘Vamos deixar de ser uma construtora para ser uma empresa de tecnologia que constrói’. Isso porque o mercado de tecnologia só escala, exponencialmente. Então, a gente procurou entender o que estava dando certo para eles e descobriu que eram as metodologias ágeis”, conta Maria Natalia Villagran de Dios, gestora de obras da incorporadora. 

“O importante do processo foi que ele veio top-down, pois como a implantação de metodologias ágeis exige uma mudança de mindset, tem que acontecer desta forma, pois é uma mudança de chave muito radical, já que você abandona todos os conceitos clássicos das metodologias de trabalho. Mas, para dar certo, também precisa que todo mundo esteja na mesma página e esteja alinhado”, analisa. O passo seguinte, portanto, foi estudar as metodologias ágeis e entender como elas poderiam ser aplicadas em seus processos. “O livro Scrum, do Jeff Sutherland, se transformou na nossa Bíblia, principalmente para os gestores”, relembra. 

Durante essa transição, alguns profissionais ficaram pelo caminho, por não se adaptarem aos novos processos, mas, após um período de 18 meses, o novo modelo já estava funcionando perfeitamente. “Não é todo mundo que realmente consegue ter a flexibilidade da mudança, principalmente porque se trata de um setor muito conservador e tradicional, não só na área operacional, mas também nos níveis mais estratégicos”, avalia. Apesar de parecer mais fácil implantar as metodologias ágeis em setores mais administrativos, na Dimas a mudança começou pelo canteiro de obras. “Eu, como gestora de obras, fiquei encarregada como PO (Product Owner) de um projeto de canteiro high-tech, que era realmente a digitalização de todos os canteiros de obras”, conta a engenheira. 

De acordo com Maria Natalia, de toda a empresa, este foi o setor onde houve mudanças mais radicais – e também mais rápidas. “No canteiro, a gente tinha uma equipe multidisciplinar que ficou focada naquilo e não dispersou, porque eram pessoas que viram o valor agregado daquilo e estavam comprometidas com a mudança. Na época, o mercado de construtechs ainda era menor, mas já oferecia inúmeras possibilidades. Nesse período de 18 meses, testamos umas 15 plataformas diferentes até encontrar as que mais se adequam ao nosso perfil de trabalho. E todos os stakeholders ao nosso redor tiveram que se adaptar, desde fornecedores de todos os tipos, até o último dos pedreiros, que tinha que usar celular para ler QR code e acessar um projeto”, ressalta. 

Um quadro de Kanban em um canteiro de obras da Dimas

Para isso, uma das principais técnicas utilizadas foi o Kanban. “Nosso quadro de Kanban está em todas as obras. Então, o que seria na tradição da construção civil uma reunião de encarregados, hoje nada mais é do que uma sprint de metodologia ágil. Todos os dias, todo mundo para na frente do quadro, por uns 15 minutos, para atualizar as tarefas que estão lá”, explica Maria Natalia. A engenheira também conta que as metodologias ágeis ajudaram a incorporadora a não atrasar suas obras durante a pandemia. “A obra na qual a gente iniciou o processo de digitalização foi entregue em agosto do ano passado, então um ano e meio dela foi dentro da pandemia. E a obra foi entregue dentro do prazo, justamente porque as metodologias ágeis permitem que as adequações de projeto sejam feitas mais rapidamente”. 

Metodologias ágeis em outros setores da incorporação

Na construtora Tenda, o processo de adoção de metodologias ágeis e transformação digital impactou mais outras áreas, principalmente no que se refere ao desenvolvimento de produtos digitais que solucionassem dores da incorporadora. O primeiro passo para essa mudança foi a substituição do data center físico para a nuvem, como conta Luis Martini, diretor de Marketing e Tecnologia da Tenda. “Essa transição foi muito importante porque é isso que permite que a transformação digital seja rápida e escalável. Não tem como ficar comprando data center físico, é um investimento altíssimo, é quase como voltar no tempo”, analisa.   

A partir daí, a incorporadora teve mais condições de apostar na inovação para digitalizar seus processos e otimizar tempo e recursos. “Historicamente, o setor da construção civil é pouco inovador, mas a gente decidiu que queria se destacar no mercado como construtech. Então, a gente optou por focar na jornada do cliente. Desde que iniciamos esse processo de implementação de metodologias ágeis e transformação digital, no final de 2018, nós desenvolvemos 11 produtos digitais que entregam etapas importantes da jornada do cliente. Para isso, utilizamos o método Scrum, desenvolvendo projetos independentes entre si e à medida que eles foram sendo concluídos, é que fomos integrando tudo”, conta Luis. 

Antes disso, a Tenda ainda tinha processos muito tradicionais em suas áreas de marketing e vendas. “Até 2018, a gente fazia comercial na TV dizendo ‘ligue para o número tal’. Tinha uma central de pré-venda, que pegava os dados desses interessados que entravam em contato e agendava uma visita para uma loja física. Esse processo não existe mais, a equipe de pré-vendas não existe mais, essas pessoas foram realocadas em outras posições onde agregam mais valor. Nós redesenhamos todo o processo do cliente, desde o momento em que ele começa a considerar a compra até o pós-venda”, ressalta. Com a integração das ações de marketing e vendas, o tempo médio de conversão de um lead em venda passou de cerca de dois meses para duas semanas. 

No entanto, apesar de ter como base o método Scrum para impulsionar essa transformação digital, Luis conta que a incorporadora fez algumas adaptações na metodologia para que ela se adequasse mais à realidade da empresa. “Normalmente, em um squad, você tem a figura do líder, o PO, que geralmente é alguém com muito background em tecnologia. A gente não queria abrir mão disso porque a gente precisou reforçar a estrutura de tecnologia com pessoas que já tinham essa mentalidade, essa experiência em trabalhar no método ágil. Mas, a gente também queria ter uma figura central com experiência na área de negócios, que é quem tem mais tempo de casa e conhecimento da cultura da empresa. Então, a gente criou uma dupla para liderar os squads. Essa outra figura, a gente chamou de Business Owner”, detalha. 

“Outra adaptação que a gente fez foi acrescentar no Scrum Master o Design Thinking, porque, na área de negócios, não é trivial pensar em todos os stakeholders e todo mundo que pode ser impactado por aquele produto”, completa. Luis ainda explica que a transição para a implementação de metodologias ágeis começou com marketing e vendas. Só depois é que a mudança chegou à área de operações, onde um dos destaque foi o desenvolvimento de um aplicativo para elaboração de boletim de vistoria digital. Já na área de relacionamento com o cliente, a grande novidade foi o desenvolvimento do aplicativo Tenda com Você, que reduziu o processo de solicitação e resolução de chamados de assistência técnica de cerca de 27 dias para 11 dias.