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Imobiliárias

Imóveis retomados são oportunidade de negócio durante e pós-pandemia

Quando a Caixa Econômica Federal anunciou, em março, a possibilidade de suspensão do pagamento das parcelas de financiamentos imobiliários por alguns meses, em função da pandemia, o mercado de imóveis retomados também passou por um momento de incertezas, assim como o restante do setor. No entanto, passados oito meses desde então, pode-se dizer que o nicho de retomados não só enfrentou a crise com maestria como também se tornou uma grande oportunidade de negócios durante e pós-pandemia. 

“Quando veio a pandemia, havia uma incerteza muito grande em relação ao que iria acontecer com os financiamentos que estão ativos, com as carteiras de crédito imobiliário dos bancos. A gente ainda não consegue ter com muita clareza o reflexo da pandemia e da inadimplência no número de imóveis retomados porque os balanços dos bancos ainda não refletem esses números, mas o que dá para apontar é o que aconteceu com o estoque dos imóveis que já estavam retomados. Aqui na Resale, a gente viu um aumento de vendas de 30% ao mês, porque esses ativos passaram a chamar a atenção de investidores menos experientes, que estavam fugindo da Bolsa e indo para um mercado menos volátil e com grandes descontos”, afirma Marcelo Prata, fundador e CEO da Resale, a primeira plataforma para venda de imóveis retomados do Brasil.

Para o corretor Diego Plytovanicz, que decidiu se especializar em imóveis retomados em 2020, o balanço do ano também foi bastante positivo. “Em uma crise, o dinheiro não some, ele apenas troca de mão. Os investidores que estavam perdendo dinheiro na Bolsa tinham que buscar opções mais seguras, mais sólidas, e vi que existia uma oportunidade ali. Minha virada de chave aconteceu em março, acreditando que esta é uma tendência que vai se manter no futuro. E valeu a pena: em apenas três meses trabalhando com imóveis retomados, faturei o equivalente a todos os meus rendimentos com comissão de 2019”, comemora. 

Mercado será beneficiado com um possível aumento da inadimplência?

Para os próximos meses, o mercado também é otimista. Ainda que o estoque de imóveis já retomados que pertencem à carteira da Caixa esteja se esgotando, com a suspensão do pagamento das parcelas de financiamento, existem outras possibilidades de captação. Mas essas oportunidades não são consequência de um possível aumento da inadimplência, como se poderia supor. “De maneira geral, o tripé que sustenta o mercado imobiliário é formado por emprego, renda e confiança do consumidor. Com a pandemia, contrariando essas premissas, a gente está vendo um mercado em forte crescimento, em franca expansão, sem emprego, sem renda e com a confiança do consumidor abalada. Ainda assim, isso não deve se refletir em um aumento da inadimplência, pois, diferente de outros países, os bancos brasileiros são muito criteriosos na concessão de crédito”, analisa Marcelo. 

“Todos os bancos trabalham com faixa provisionada de inadimplência, quando oferecem crédito imobiliário. A Caixa, por exemplo, trabalha com uma margem de até 3,8% de inadimplentes, mas a média nunca chega nem a 2,7%. Desta forma, mesmo com crédito facilitado e juros baixos, é muito pouco provável que a taxa de inadimplência passe disso, mesmo no próximo ano, quando a economia ainda pode estar um pouco instável”, avalia Guilherme de Lima, proprietário da Facilit Imóveis. “É claro que quando você faz um recorte para alguns produtos, por exemplo, no MCMV, dependendo da faixa de crédito, você vai ter uma inadimplência que chega a 5%, 6%. Mas, de forma geral, é natural que, com o ciclo do crédito, a gente sempre vai ter aquele mesmo índice de inadimplência”, completa Marcelo. 

Mas, então, se a aposta não está no aumento da inadimplência, onde estão as oportunidades para o mercado de retomados nos próximos meses? “Com a suspensão do pagamento das parcelas do financiamento, leilões sendo cancelados e um atraso maior nos processos de retomada devido à pandemia, há uma remessa represada, que deve manter o mercado aquecido quando for liberado novamente”, acredita Diego. Já para Guilherme, a solução está em apostar em carteiras mais variadas. “Enquanto o estoque da Caixa ainda está represado, uma opção é buscar outras fontes de imóveis com desconto comercial, como bancos privados que não suspenderam o pagamento das parcelas e até mesmo o Banco do Brasil, que tem um estoque de retomados muito grande que nunca tinha sido ofertado até pouco tempo atrás e agora está começando a oferecer essa possibilidade”, indica Guilherme. 

Marcelo ainda ressalta que há um ponto importante sobre o mercado que é importante ter em mente quando se fala em estoques. “Quando um banco retoma um imóvel, ele assume todas as dívidas, como IPTU e condomínio, além de ter de pagar os impostos, como ITBI. Então, dá para dizer que esse mercado é pelo menos três vezes maior do que os bancos declaram porque nem todos os bancos executam a régua de cobrança como deveriam exatamente porque não adianta retomar e ficar com esse ativo depreciando e assumindo as dívidas dele”, explica.

A partir dessa informação, é possível ter mais clareza a respeito do mercado e possíveis fontes de captação de imóveis retomados. Como a  Caixa é o principal agente financiador, com market share significativo desse mercado, é natural que ela tenha a maior carteira de retomados, mas todos os bancos privados possuem estoque. Marcelo também aponta os imóveis que são do governo federal, que passa por um forte movimento de desmobilização de patrimônio, além das fintechs, que são entrantes nesse mercado e também têm imóveis como garantia, e o mercado de ponta de estoque. “São as incorporadoras que ainda têm algum tipo de dívida com os bancos porque financiaram suas obras e aí essas unidades, para quitar suas dívidas, são entregues como pagamento e esses ativos também vêm com um valor abaixo de mercado”, completa. 

Como se tornar um corretor de imóveis retomados?

Pouco explorado no Brasil, o mercado de imóveis retomados ainda tem espaço para outros corretores e imobiliárias que queiram se aventurar na área, com destaque para algumas regiões do país. De acordo com dados da Resale, que faz um levantamento a cada três meses, mostrando como está o estoque dos ativos, cerca de 36% do total de imóveis retomados estão na região Nordeste, seguida pelo Sudeste (28%), Centro-Oeste (22%), Norte (7,5%) e Sul (5%). “A região Nordeste tem seis vezes mais imóveis retomados do que a região Sul. Esses estoques têm muito a ver com os programas de governo porque a gente tem de lembrar que os imóveis são retomados independente da linha de crédito, então pode ter sido de alta renda, com recursos da caderneta de poupança, ou também os financiados pelo MCMV. Então, ele segue muito como aconteceu a expansão do mercado nos últimos anos”, informa Marcelo. 

É por isso que, na opinião de Diego, o corretor de imóveis retomados não pode ter atuação restrita a uma única praça. “É preciso saber mapear as oportunidades, além de ter planejamento financeiro para fazer viagens para as cidades onde há oportunidades e também para ter não passar do seu limite de gastos quando der lances em leilões”, diz. Já Guilherme acredita que, para se dar bem nesse nicho de mercado, é necessário estudar muito. “É importante ter um conhecimento específico, como entender a Lei de Alienação Judiciária. São pouquíssimos os corretores que já conhecem o teor dessa lei, mas o cerne do mercado imobiliário está ali. Também é importante acompanhar leilões e começar a vivenciar esse mercado, entendendo quem são os compradores em potencial”. 

E quem são os compradores de imóveis retomados?

“Na Resale, como temos um inventário muito grande de imóveis, temos imóveis para todos os gostos, para todos os perfis. Mas, nossa menor base de cliente ainda é o comprador final, que é quem está comprando para morar, muito em função de uma particularidade do mercado, que é fato de que a menor parcela dos imóveis está desocupada, então é mais difícil que a gente venda para o cliente final. Hoje, nossa grande base é de investidores iniciantes, são pessoas que estão começando a olhar para esse mercado, saindo do mercado financeiro em função da volatilidade ou até das taxas de juros muito baixas”, afirma Marcelo. De acordo com ele, 60% dos clientes da Resale são investidores iniciantes, 30% são investidores com mais experiência e que já compram em leilão e somente 10% são cliente final. No caso da Facilit, o percentual de vendas para investidores é semelhante – 90%, de acordo com Guilherme.